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Crónica

NESTA CIDADE

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Nesta cidade ouvem-se muitas gaivotas. Às vezes são elas que nos acordam, outras vezes somos nós que acordamos antes delas.

Nesta cidade veem-se muitas crianças. Não sei se são elas que riem muito ou se somos nós que rimos com elas.

Nesta cidade encontram-se muitos avós. Dois avós por criança. Uma mão de cada lado, para ajudar a saltitar os degraus.

Nesta cidade há muitos autocarros. Não sei se sou eu que passo a vida neles ou se são eles que estão cheios de vida.

Nesta cidade há muitos engravatados. Não sei se são eles que andam zangados, porque o intervalo de almoço não chega para nada ou se sou eu que tenho demasiado tempo para almoçar.

Nesta cidade há muitas pessoas. E demasiadas estão com pressa. Sempre a olhar para o chão ou para o telemóvel ou para o relógio. Sem nunca verem as gaivotas, as crianças, os avós, os autocarros e os engravatados. Nesta cidade há demasiados bancos vazios.

Vem. Vem sentar-te comigo naquele banco. Vamos calar-nos uns minutos e apurar os sentidos. Achas que consegues?

(Escrito ao som de “Let’s be Still” dos The Head and the Heart)

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1 Comment

1 Comment

  1. JC

    03/05/2016 at 20:45

    Lindo, Inês

    Eu sou um engravatado estúpido que não olha para nada nem tampouco se senta num banco para escutar o interior.
    Quem me dera descansar um pouco! Já nem sei se tenho sentidos para além de um ouvido “mouco”, uma visão míope, um tacto áspero sobre realidades pouco tangíveis, um olfacto que já não apreende outro odor senão o de quem se inunda em perfume para ocultar o seu imundo fedor, um paladar que ainda é a única coisinha de jeito…
    Beijinhos querida subas

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