Crónica

UMA SANGRENTA REALIDADE EM ASCENSÃO

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Fiquei surpreendido por ainda não ter visto aqui no JUP nada sobre o mais recente ataque terrorista. É verdade que o ataque não foi em Portugal, nem no Porto, nem sequer a universitários. No entanto, passando rapidamente os olhos no jornal, particularmente pela secção de Opinião, claramente se nota que o JUP não se deixa limitar pelo seu nome, abordando temas que interessam a universitários não somente enquanto estudantes, mas também enquanto pessoas.

Para aqueles a contactar com o mundo pela primeira vez desde sábado, quando falo do ataque terrorista refiro-me ao que se sucedeu na madrugada de domingo, 12 de junho, em Orlando, estado da Flórida, nos EUA. Basicamente, um homem entrou armado num gay nightclub e provocou o pior mass shooting da história americana – não contando com situações de guerra –, fazendo 50 mortos e 53 feridos.

Estes números são assustadores e não mostram tendência para diminuir. De acordo com o Mass Shooting Tracker, nos EUA já houve 176 ataques deste tipo só em 2016, em contraste com os 140 de 2015,[1] e o número ainda menor de 124 em 2014[2]. De janeiro a junho em 2014 houve 157 mortos e 524 feridos, em 2015 houve 221 mortos e 613 feridos, e em 2016, antes do final deste mês, os números subiram para 285 mortos e 649 feridos. Vale, ainda, notar que o número de mortos quase duplicou de 2014 para 2016, e só o ataque de Orlando equivale a cerca de um terço do total em 2014 até junho.

Para vos confessar uma coisa, nestes últimos meses como consequência dos vários ataques que aconteceram na Europa e nos EUA, eu deixei de me preocupar com os mais recentes que vêm aparecendo nas notícias. Quando, eventualmente, um elemento da sociedade mais interessado que eu me contava de algum, a minha reacção era simplesmente: “Outro?!”. Revirava os olhos, suspirava com o crescente desapontamento no mundo e esquecia o assunto. Contudo, não consegui fazer isso de novo este domingo. Ao deparar-me com suficientes notícias até perceber que era sério, não fui capaz de prestar a desonra a estas vítimas como consegui a tantas outras antes. Percebo agora que a minha atitude anterior foi vergonhosa, mas acredito que faça parte de um ciclo.

Aquando dos ataques ao Charlie Hebdo do ano passado, inicialmente partilhei o furor e preocupação geral, informando-me e discutindo os acontecimentos, todavia, muito rapidamente, apercebi-me da decadência dos telejornais portugueses que aproveitaram a tragédia para preencher o tempo de antena quase completamente com repetições da informação que já foi divulgada no dia anterior e no dia anterior ao anterior. Também aqui se passa o mesmo e certamente a informação já divulgada ontem e no dia anterior a ontem será divulgada de novo amanhã. Quando isto falha, passam para o sensacionalismo e exploração emocional dos espectadores. Revirava os olhos ao mensageiro e com o passar do tempo e com os novos e vários ataques que foram surgindo, revirava também os olhos à mensagem. Agora já não o posso fazer mais. Basta!

Sofro com as 93 vítimas e as suas famílias, sofro com a comunidade LGBT que continua a ser alvo de terror, sofro com a comunidade muçulmana que tem a sua cultura e religião manchados por extremistas.

O que me sossega são os muitos que sofrem comigo, são as filas de espera para doar sangue às vítimas, as organizações de apoio, as homenagens pelo mundo fora, aqueles que gritam “basta!” e que lutam por um mundo melhor. Saber que há centenas ou milhares de guerreiros da paz, tolerância e igualdade por cada terrorista é o que nos deve fazer dormir à noite. E ser mais um guerreiro o que nos deve fazer acordar de manhã.

Depois de escrever este artigo reparei que já tinham havido mais dois tiroteios nesta segunda-feira com 4 e 5 feridos cada, mas sem mortos. Não sei o que pensar senão um incrédulo “Como?!”.

[1] Entre 1/1/2015 e 12/6/2015

[2] Entre 1/1/2014 e 12/6/2014

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