Crónica

A MORTE DA ARTE

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Há algum tempo foi publicado um artigo onde se verificavam os cursos superiores com menos saídas profissionais em Portugal. Filosofia assume o topo da lista. Como estudante de Filosofia, será esta a minha leal e nobre companheira neste devaneio.

Cada vez mais nos é presente a noção de que nem todos os cursos superiores oferecem estabilidade no futuro. Temos em nós presente a noção de que, finda a vida académica, não mais existem certezas. Porém, nem todos nós olhamos para um curso superior como o nosso futuro. Estamos cientes de que há uma geração que anseia uma vida na Arte. Nietzsche escreveu «Não basta ter-se talento: é preciso ter-se o vosso assentimento para o possuir, não é verdade, meus amigos?» e facilmente nos é possível transpor este seu pensamento para a realidade de hoje. Não basta ter talento e querer partilhá-lo, é necessário que alguém nos conceda o seu assentimento para sermos reconhecidos como talentosos para que o nosso futuro possa ser de facto a Arte. É essa a realidade em Portugal, que já não tem portas abertas para novos artistas, apenas janelas entreabertas.

Mas o que é ser artista? Citando, uma vez mais, Nietzsche «Qualquer artista, olhando para trás, tem a sincera opinião de que o verdadeiro valor de uma coisa é uma ‘sombra’ que pode ser fixada nas cores, na forma, no som, no pensamento.»

Ser artista é o espírito do ser. Nascemos artistas e morremos artistas. Quer seja um escritor, um pintor, um ator, um músico… a arte é a expressão do ser, a expressão de si mesmo. Alguns dirão que a Arte é para os artistas, e para aqueles que não o são uma janela para escapar à vida real, como quando, numa longa viagem, olhamos pela janela e nos perdemos no mundo que lá fora não pára. A Arte é uma virtude do ser. Na Filosofia, alguns pontos de vista expressam que a Arte é a plena expressão do ser. E é isso que aqui defendo. A Arte é a expressão plena do ser que a realiza, é através dela que ele conhece o mundo e se conhece a si mesmo.

«Os leitores extraem dos livros. Consoante o seu carácter, a exemplo, da abelha ou da aranha que, do suco das flores, uma o mel, a outra o veneno.», escrevia Nietzsche.  É essa a essência não só da Literatura, mas de toda a arte. Ao admirarmos a arte, extraímos dela aquilo que o nosso ente mais anseia. Ser artista é a ânsia da expressão do espírito que toca outros seres de forma una, singular mas sempre plena. A Arte é a infinitude do sujeito, a plena realização do mesmo. Este conhece-se a si e quem aprecia a arte e dela extrai aquilo que o seu espírito anseia conhece-se também a si mesmo.

Ser artista é parte do ser. O reconhecimento é apenas o assentimento de alguém que nos diz que, de facto, temos talento. A Arte pode ter morrido com a falta de investimento nos novos artistas, a falta de assentimento para que imortalizemos o hoje para as gerações futuras. Contudo, enquanto o artista for espírito e se conhecer a si mesmo na plena realização da sua Arte, a Arte viverá para sempre.

Para todos os artistas, debruço-me novamente na Filosofia de Nietzsche para expressar aquilo que penso em relação a todos os artistas que anseiam o assentimento de outrem em relação ao seu trabalho: «Não vos aconselho o trabalho, mas a luta. Não vos aconselho a paz, mas a vitória! Seja o vosso trabalho uma luta! Seja a vossa paz uma vitória!»

 

Observação: O título desta crónica é uma referência à visão filosófica da Estética em Hegel.

2 Comments

  1. Rui André A. Soares

    13/01/2015 at 14:57

    Boa tarde,

    Li o seu artigo ( digo “seu”, mas sou um jovem, é apenas um formalismo ) e queria pedir-lhe autorização para publicar o texto numa página de facebook: “Comunidade Cultura e Arte”.

    Por coincidência hoje criei uma frase oposta, mas talvez por causa dos ecos do terrorismo.

    Pensar é hoje um exagero – a imagem consumiu a opinião e a voz da consciência é o lugar onde tudo vai morrendo.

    Aguardo uma resposta para a autorização
    Cumprimentos

    • Joana de Sousa

      14/01/2015 at 21:23

      Boa noite,
      Peço desculpa pela resposta tardia.
      Já enviei uma mensagem para a vossa página de facebook em que lhe digo que tem a minha autorização para a publicação do texto.
      Sou fiel seguidora da vossa página e admiro bastante o vosso trabalho. E, na verdade, sinto-me lisonjeada por se interessarem num dos meus devaneios.
      Cumprimentos e continuação de um bom trabalho.
      Joana de Sousa

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