Crónica

ACTO DE PRIMAVERA

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Joana de Sousa

«La utopía está en el horizonte. Y dijo: Yo sé muy bien que nunca la alcanzaré.»

Eduardo Galeano

 

Num dos seus ensaios, Theodor Adorno apresenta o conceito de desestetização para formular uma crítica a Martin Heidegger e à forma como este debruçou o seu pensamento sobre a Poesia, nomeadamente sobre a poesia de Friedrich Hölderlin. Segundo Theodor Adorno, Martin Heidegger debruçou-se sobre os poemas de Friedrich Hölderlin, desestetizando-os, isto é, negligenciando a sua formulação original, estando Heidegger apenas interessado na mensagem que é imediatamente compreendida no poema. A crítica central de Theodor Adorno consistia, assim, na negligência da textura sensível do poema, descurando o modo de se criar este mesmo poema, atendendo apenas à mensagem que este transmite de uma forma mais imediata. A crítica de Adorno pode ser enunciada como uma ignorância à natureza sensível da poesia, e, embora esta seja uma crítica de contornos estéticos e filosóficos, pode ser considerada válida no tempo presente no que concerne à Poesia. Consideramos, num sentido geral, a Poesia pela mensagem que transmite de forma mais imediata, negligenciando a sua natureza sensível e descurando a utopia em que a Poesia se encontra. A Poesia, na sua formulação e textura sensíveis, é uma utopia sem lugar ou tempo, revolucionária, um ideal de perfeição… A Poesia, sendo ela uma utopia, é a dimensão gloriosa do real, sem espaço ou tempo, é o alcance da perfeição, um acto de primavera, onde o sol brilha, e as flores acabam a espera da promessa antiga, de uma manhã de cheiros e maresia.

 

Observação: O título desta crónica é uma referência a uma das longas-metragens do Mestre Manoel de Oliveira.

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