QUEM DÁ MAIS (NÃO INTERESSA)

Beatriz Carneiro

Primeiro estranha-se e depois entranha-se. Primeiro estranha-se que aquele às da bola, o que beijava o símbolo quando marcava um golo, tenha trocado o equipamento e se tenha aventurado por outros caminhos futebolísticos. Primeiro estranha-se que aquele grande treinador, o que levou o clube à vitória, tenha escolhido a maçã verde em vez da maçã vermelha. Primeiro estranha-se, mas depois entranha-se tudo, não temos outro remédio.

Antes de entranhar, passam pela nossa cabeça os milhões. “Epá, mais um que foi pelo dinheiro!”, diz o avô à mesa de jantar, porque, como ele diz, eles são todos iguais.  E a verdade é que quem dá mais, fica com a mercadoria. Porque, a verdade, é que não passam de transações, de negócios, em que o que se troca é um indivíduo que sabe dar uns toques na bola.

“Quem dá mais? Nada disso!”, diz quem salta de um lado para o outro. “Foi tudo por motivos do coração e de realização profissional”. Aqui ficamos na dúvida, se calhar nem foi pelo dinheiro, “E a vida é dele, faz o que quiser.” Mas não demora até os milhões nos passarem outra vez pela cabeça.

No meio deste rebuliço do “quem dá mais?”, estão, então, os que mais sofrem com toda esta jogatina e estratégia: os adeptos. Esses sim, merecem milhões. Não recebem nada, chateiam-se com a mulher porque está na hora do jogo e não da novela, ouelas com o marido, porque ele teima em não mudar de clube. Gastam dinheiro nos bilhetes, porque “Opá, aquele estádio é uma maravilha”. Uma indemnização por danos morais devido às trocas e baldrocas que acontecem era de considerar.

Mas eles não querem nada disso. Só querem continuar a apreciar aquele que pode ser um bonito espetáculo, querem vestir a camisola, o cachecol, cantar as músicas, dizer palavrões, chatearem-se com o treinador e com o árbitro ou com o marmanjo que falhou aquele penálti. Porque vale tudo, até chorar quando são campeões.

Assim, quem dá mais acaba por não interessar muito, porque vão sempre existir adeptos que fazem do futebol o que ele é, um jogo para todos e não para quem dá mais. Bem-vindos ao futebol.