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Crónica

ISSO É OUTRA HISTÓRIA (NUM AUTOCARRO)

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Beatriz Carneiro

Beatriz Carneiro

Aviso: isto é outra crónica sobre uma viagem de autocarro.

É verdade, aconteceu outra vez. Por muito que tente escapar, os autocarros contam-me as peripécias, histórias e os problemas das gentes. Desenham as caricaturas de quem tira bilhete e sussuram o que lhes apetece. Alguém lhes devia ensinar boas maneiras (aos autocarros).

Durante esta viagem, fiquei a saber que há um novo jogo de apostas: “Tiras o extrato e escolhes lá o coiso”. Até aprendi como se joga. “Olha que isto da sorte…no noutro dia a fulana estava a dizer que o 56 nunca saía, e pumba, saiu nessa semana!”

São comuns os relatos de viagens de autocarro. É provável que a maior parte das pessoas já tenha ouvido uma frase parecida com “Nem imaginas o que aconteceu hoje no 207!”. Nesses relatos, tudo tem cabidela: pancadaria, conversas paralelas; alguém que discutiu com o motorista, porque ele parou 1 metro depois do sítio onde era suposto parar; um jovem que ia a dar música a todos os passageiros, literalmente; uma senhora que se atrapalhou e caiu com as sacas das compras; aquele indivíduo que fala ao telemóvel e todos ficam a saber de quem é que ele não gosta do departamento de contabilidade; aquela pessoa que transpira demasiado (esta última agrava-se quando o autocarro está cheio e vamos todos colados uns aos outros). Vale tudo.

Mas o tema da minha viagem, como já disse antes, foram as apostas. Estavam em causa duas perspetivas. Uma delas defendia afincadamente que “para sair é preciso jogar”. A outra parte, com um ar resignado, não estava muito interessada em gastar dinheiro com essas “jogadas de sorte”, como lhes chamou. Mas a parte que acreditava e demonstrava essa crença na sorte, não desistiu de convencer quem a ouvia, de que “quando menos se espera, a vida pode dar uma cambalhota”. Toda uma retórica decorreu, desde o Cais de Gaia até à Estação de São Bento, onde até o 31.º aniversário de um filho serviu de argumento para convencer de que o que pode parecer coincidência é antes a amiga sorte a bater à porta. A verdade é que resultou. Foi ouvir a outra comadre a dizer “Anda, que é esta a nossa paragem! E depois vamos ali ao quiosque que eu quero jogar nisso então.”

A constante ocorrência destes pequenos eventos, torna-os impossíveis de serem ignorados por quem usa os autocarros na sua rotina diária. E assim, é inevitável que a maioria de nós já tenha ouvido algumas histórias um tanto engraçadas sobre estas viagens, porque depois de tanta emoção, existe sempre quem tenha a necessidade de contar “o que aconteceu hoje no 207”.

Acho que a solução é começar a andar de elétrico, mas isso é outra história.

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