Artigo de Opinião
REPROVAR OU NÃO REPROVAR: EIS A QUESTÃO
Saíram esta semana os resultados de um relatório da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) sobre o insucesso escolar e as suas causas, baseado nos resultados dos testes PISA de 2012. Este relatório tenta perceber a influência no sucesso dos estudantes de fatores como o contexto económico-social, as políticas educativas, o nível de escolaridade parental, entre muitos outros.
São apontados alguns fatores de risco, sendo o principal, segundo o relatório, a elevada percentagem de estudantes que já reprovaram pelo menos uma vez. Como resposta, diz o governo que é necessário reduzir o número de retenções, e eu concordo. O problema é a forma como isso se consegue. Só existem dois caminhos: ou melhoramos a qualidade da educação, ou diminuímos a exigência. Olhando ao historial que Portugal tem em políticas educativas, só posso ficar preocupado com o caminho a tomar.
Alguém que tenha passado pelo ensino público em Portugal nos últimos 20 anos saberá que existem muitos problemas para resolver, e nenhum deles é um excesso de exigência. Pelo contrário, diria até que a tendência para o facilitismo se tem acentuado. Outro dos fatores de risco apontados pela OCDE é a falta de interesse por parte dos professores, e este pode relacionar-se facilmente com o facilitismo. Ensinar bem e ser exigente são tarefas árduas, que requerem preparação de aulas, cansaço no final de um dia de trabalho e, por vezes, incluem até problemas com os encarregados de educação. O acesso aos cursos do ensino superior, baseado exclusivamente em médias e negligenciando outro tipo de competências sociais ou humanas, faz com que acabem como professores pessoas que não têm qualquer tipo de vocação ou competência para desempenhar uma das mais nobres e fulcrais profissões da sociedade, hoje subvalorizada. (Uma palavra de apreço aos bons professores que lutam custosamente para transformar esta situação, nem sempre com sucesso).
Curiosamente, há uma conclusão do relatório da OCDE que o governo deixa passar sem qualquer comentário, e que me parece bem mais importante. Parece que as características socioeconómicas dos estudantes só explicam 15% das variações entre os desempenhos dos estudantes, enquanto o tipo de políticas seguidas pelos estados e o grau de autonomia curricular atribuído às escolas conta 35%. Justificar-se-ia muito mais uma tentativa de solucionar o problema partindo deste último dado.
Portugal tem tido políticas de educação tão instáveis, ao sabor dos diferentes partidos, que se torna difícil perceber quais foram boas e quais foram más, já que nenhuma esteve em vigor tempo suficiente para os resultados falarem por si. Sabemos, ainda assim, que a autonomia das escolas é muito reduzida em termos de apostas curriculares diferenciadoras, algo que é justificado com a necessidade de uniformização dos currículos mas que, em termos práticos, o relatório da OCDE apresenta como prejudicial.
Há diversas áreas em que é urgente trabalho de qualidade, como a elaboração de uma avaliação justa e exigente dos professores, uma reforma do sistema de ensino, uma reflexão acerca dos conteúdos programáticos que, no século XXI, mais cedo ou mais tarde, terão de ser incluídos na escolaridade básica e secundária, entre outras.
A equipa ministerial da educação afigurou-se como uma esperança para o ensino, diferente das que tivemos nos últimos 10 anos. Mantenho uma grande expectativa, mesmo depois da forma atabalhoada e algo suspeita como foi gerido o dossier dos exames e provas de aferição no ensino básico. Espero sinceramente que o senhor Ministro não tente a diminuição de reprovações pela taxa de reprovações em si, mas sim pelo aumento da qualidade do sistema, começando nos professores e acabando nos currículos. E espero, sobretudo, que possamos finalmente ter consensos políticos alargados para que possa existir coerência nas políticas educativas.