Artigo de Opinião

ESTAGIÁRIOS PARA SEMPRE?

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Passo a explicar… Quando o famoso “canudo” está finalmente nas nossas mãos, depois de três anos de grande esforço intelectual e, acima de tudo, financeiro, a grande parte da oferta de emprego que encontramos seja na Internet ou nos jornais, prende-se com os tão famosos estágios profissionais – todo um mundo de “benesses” à nossa espera que esmorece à medida que os nove meses de trabalho chegam ao final. As perspetivas de um contrato de trabalho são quase nulas visto que, por lei, apenas um em cada três estagiários são obrigados a permanecer com contrato na empresa que os acolheu. A questão impõe-se: e os outros dois?

A finalidade principal destes estágios profissionais, integrar os jovens no mercado de trabalho após a saída da universidade, deixou há muito de ser válida. Ao invés de dar ferramentas aos jovens para  enfrentarem todas as componentes de um contrato de trabalho, passou a ser uma ferramenta fria de subsidiar empresas que apenas têm de pagar aos seus trabalhadores/estagiários um valor muito inferior ao salário mínimo, vejamos: nestes estágios promovidos pelo IEFP, o valor mais alto que o estagiário pode vir a auferir é de 691€, onde a empresa acolhedora apenas é responsável pelo pagamento dos subsídios de transporte, alimentação e seguro, o que correspondente ao máximo do salário de 691€, apenas fica a caber ao patronato pagar cerca de 284€, menos de metade do salário mínimo nacional!
Ao analisarmos estes valores, rapidamente conseguimos entender que efetivamente compensa uma empresa contratar estagiários –   por um lado, mais trabalhadores representam mais produtividade; por outro lado, sendo o Estado a subsidiar mais de metade do rendimento do estagiário, a maior parte do trabalho produzido pelo mesmo apenas representa lucro para a referida empresa.

Esta máscara dos números da taxa de desemprego tem de acabar! Desengane-se quem pensa que os estágios são até aos 30 anos… Em 2015, durante o mandato de Passos Coelho, foi criado um programa chamado REATIVAR que pretende criar estágios, veja-se bem, estágios, para cidadãos com mais de 31 anos, desempregados de longa duração. Pois bem, na faixa etária dos 30 anos seria expectável um cidadão comum português já ter uma vida minimamente estabilizada, com um contrato de trabalho, boas condições laborais, onde a precariedade não fosse a palavra de ordem – resumindo, uma vida financeira estável para que assim seja também possível criar uma família, com todos os desígnios que conhecemos. Mas não é isto que acontece! No nosso país, com 30 anos, há quem nunca tenha conseguido um simples contrato de trabalho remunerado, vivemos num constante “salta pocinhas” e isto não tem qualquer fim à vista.

A polémica mais recente prende-se com os “estágios” da Work4u, uma espécie de “empresa” de recursos humanos que se propunha dar às empresas estagiários durante dois dias e, se as empresas não gostassem do trabalho desempenhado pelo estagiário, havia a possibilidade irrisória de devolução do mesmo sem que fosse pago pelo seu trabalho. Mas atenção, há algo que torna este caso ainda mais macabro. Os anúncios eram aliciantes, os títulos diziam ser empregos de caráter urgente e prometiam empresas de “prestigiado renome”; porém, a farsa não acaba aqui. As entrevistas desta empresa de recursos humanos eram em Lisboa, obrigando os candidatos a pagar uma taxa de inscrição, deslocações até Lisboa e ainda se viam obrigados a utilizar os seus materiais, correndo o risco de não serem aceites nos dois dias de “teste” e de terem trabalhado de borla. Chegamos ao ponto onde mais grave do que não receber pelo nosso trabalho, ainda pagamos para o fazer!
Depois disto questiono-me seriamente se somos vistos como pessoas ou como seres descartáveis que nada valem. Basta! Onde está a dignidade da pessoa humana, proclamada na Constituição da República Portuguesa?
É urgente criar medidas que travem este abuso desmedido de poder. É urgente levar esta discussão ao Parlamento. É urgente que se regule de forma digna e consciente. Acima de tudo, é urgente que olhem para nós como pessoas e não como números.

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