Artigo de Opinião
A UNIVERSIDADE E A MENS SANA IN CORPORE SANO
Na missão da maior parte das universidades está inscrita a intenção de proteger a mente e o corpo. Num dos mais bonitos e conseguidos textos sobre esta matéria, da Universidade de Cornell, uma das grandes universidades norte-americanas, diz-se assim “In an age of rapid technological development and digital information, when knowledge is increasingly integrated across the globe, higher education, knowledge, and the ability to use it for good have never been as important to society. The benefits to individuals beyond the direct, incalculable value of a liberal education include higher income levels and better health.” Ou de uma forma mais directa “We don’t separate life and education. At Cornell living is learning” reafirmando o pressuposto de que se aprende através das vivências, sejam elas no interior ou fora da sala, e que a universidade deve estar comprometida para que as vivências fora da sala de aula sejam também elas de excelência. De certa maneira, a universidade ao proporcionar experiências de vida plenas de significado, fora do contexto académico, estará a contribuir para a construção de seres humanos capazes de terem uma vida com sentido.
Nas universidades portuguesas, valeria a pena tentar perceber, como estão organizados os ciclos de de estudos e de lazer para dar resposta a esta missão, uma das mais nobres da universidade. Apesar dos avanços tímidos nesta matéria e do esforço diário dos responsáveis mais directos para que as coisas funcionem, o panorama continua desolador. A maioria dos estudantes e funcionários das nossas universidades não vê a instituição como um local que incentive a prática desportiva regular e, muito menos, um local capaz de proporcionar uma experiência alimentar de excepção. Na maioria dos casos, as cantinas são locais onde se come a baixo custo, sem riscos de uma intoxicação alimentar, mas pouco mais. E os locais para a prática desportiva regular são zonas de difícil acesso para muitos estudantes, com horários pouco compatíveis, com balneários de fraca qualidade, com pouca segurança à noite ou ao fim de semana. Para não falar da qualidade para a prática desportiva de algumas instalações per si.
Sabemos hoje que a alimentação saudável e a actividade física regular são dois dos principais determinantes da saúde. Que se treinam e se praticam diariamente. Que se aprendem a gostar. Que se estimulam. Sabemos também que os nossos estudantes, onde o Estado português e as famílias estão a fazer forte investimento, e que serão no futuro a elite deste país (não tenho receio de o afirmar) estão a perder na Universidade uma oportunidade única para serem adultos saudáveis. Ou seja, para treinarem e desenvolverem as suas competências físicas e também as do ponto de vista alimentar. De facto, os poucos hábitos de prática desportiva regular que vinham do secundário, perdem-se muitas vezes aqui. Do ponto de vista nutricional, grassa a má alimentação e é recorrente o recurso à fast-food. Nos períodos de exames e stress aumentado a coisa piora, com consumo frequente de alimentos hipercalóricos misturados com estimulantes de toda a ordem, onde o café é o mal menor. Para agravar o panorama, persiste toda uma cultura de consumo alcoólico excessivo que nunca foi banida e que é tolerada, patrocinando inclusive diversas celebrações desportivas e académicas por este país fora. Do ponto de vista social e cultural, o panorama ainda se agrava mais. A alimentação de muitos dos nossos estudantes, que estão deslocados da família, é feita a correr durante o almoço e de forma mais ou menos isolada ao jantar. A insonorização da maioria dos espaços alimentares não está preparada para uma conversa que não seja a gritar. E com raras excepções, a oferta alimentar, no geral, não incentiva a aprendizagem de novos sabores, a ligação a determinados produtos sazonais, a especificidades regionais ou a realidades culturais diferentes.
Investimos em laboratórios mas demos pouca importância ao resto. Criámos uma universidade próxima do cérebro mas longe do corpo. Com consequências nefastas no futuro. Estamos a formar pessoas que terão cargos de responsabilidade. Onde o país investirá. Que serão em alguns casos, exemplos e modelos a seguir. Contudo, da universidade sairão com uma fraquíssima cultura física, desportiva e alimentar. Com maior risco de doença, com menor capacidade de utilizar o desporto para gerir o stress, com menor longevidade e maior absentismo por doença, com uma fraquíssima cultura alimentar. A universidade está ainda longe de cumprir a sua missão.
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