Artigo de Opinião
PARA QUANDO A REVOLUÇÃO?
Agimos como filhos bastardos de uma deslumbrante história que se caracteriza por individualidades, que através de ousadias rebeldes se insurgem e inspiram nas massas amorfas e cinzentas uma sensação de esperança e de possibilidade. Possibilidade de restaurar a crença no próximo, possibilidade de contrariar particularidades já indevidamente consentidas e consideradas intrínsecas, tais como a malícia e a ausência total de altruísmo. Encaramos com naturalidade a condição primária do ser humano, desculpabilizamos uma atualidade decrépita, considerando o mal como uma consequência natural e previsível e o bem como uma utopia apenas praticável nas avariadas mentes dos dementes. A própria moral que rege a nossa racionalidade e os nossos sentimentalismos representa a primeira e a mais fétida mentira, a falsidade presente em muitas das virtudes que hoje valorizamos condiciona as nossas ações e mantém encarcerada a vontade de reagir. Vivemos aprisionados na nossa própria moral e apenas partilhamos o dom de comentar com desdém e reprovação os feitos políticos que de forma bem menos camuflada ilustram autênticos roubos. Facilmente se prescinde da necessidade de metáforas para caracterizar os intuitos e vontades partidárias, são mais que descarados os crimes perpetrados sob disfarce constitucional.
Já não temos os vilões totalitários, a personalidade vil e ignóbil para temer, não existe a repressão palpável e a censura audível. Deixou de haver as juventudes do regime a moldar as mentes dos mais novos, consideramos já não haver causas sociais capazes de nos fazer arrepiar a pele e de nos afogar os olhos em raiva flamejante, tudo se discute e tudo se perdoa, ninguém é mau, só menos bom. Afinal vivemos no refrescante mundo novo, somos os sobreviventes de inúmeros e fatídicos conflitos, somos abençoados pela dádiva democrática e quem se recusar a aceitar esta epidemia política sujeita-se a uma visita menos agradável dos americanos sensacionalistas e militaristas, tudo por uma causa: a igualdade e a paz.
A hipocrisia em que vivemos só é comparável com o Terror na França de 1792, onde Robespierre proclamou como alicerces constitucionais a liberdade, igualdade e fraternidade e mesmo assim se continuava a legitimar a escravatura e se mantinha a obstinação e relutância relativamente à independência das suas colónias. Hoje, julgamos viver livres, sem repressão, até usufruímos exacerbadamente das liberdades conquistadas por outros que não nós, o que não entendemos é que nós de forma voluntária nos fechamos numa cela e sem grande debate nos livramos da chave, somos engolidos por uma globalização que embrutece quem mais se devia indignar, onde a igualdade fútil prevalece e a diferença é vista como um forte estigma. Documentamos o nosso quotidiano, desempregando os 007 do mundo novo, permitimos abusos constantes sem oferecer resistência, estudamos aqueles que fizeram a diferença, mas reina em nós a sensação leiga de que é impossível mudar, teimamos em ser demagogos desde a placenta, toleramos, aceitamos, consentimos, compreendemos, perdoamos, esquecemos, desvalorizamos, ignoramos e descredibilizamos a ameaça, com esta inércia, penhoramos não só o nosso, mas o futuro dos que se seguem!
Já chega! Há que mortalizar os responsáveis pela falência económica e de valores a que assistimos, da mesma maneira que julgamos inevitável assim continuar, então também é possível mudar, nada te impede de sair à rua e gritar, mostra-te louco, eles temem os loucos, não te alimentes do que eles te segredam, inflaciona o espírito dos que te rodeiam, não priorizes os gestos fúteis e narcisistas, dá primazia à revolução que se avizinha. A elite política só irá temer as suas ações quando os jovens se fizerem ouvir, da mesma maneira com que agora estão a ser exímios no seu silêncio, lembra-te da mentira histórica que estás a viver, dois vencimentos não se revelam suficientes para alimentar uma família, não acenes com mera insatisfação as notícias reveladoras de corrupção e de fraude, podes não ser o que sempre sonhaste, mas uma coisa que está perfeitamente ao teu alcance é a possibilidade de seres diferente, por isso eu pergunto ainda num tom convencional: Para quando a revolução?
David Guimarães
25 Ago 2014 at 1:47
Amigo Gonçalo,
Bom artigo, com bons conhecimentos e desejo de mudança! No próximo, espero ideias mais concretas, para assim, eventualmente, aderir à causa.
Um abraço
Pedro Marques Pinto
3 Set 2014 at 12:54
Camarada Gonçalo,
é interessante acompanhar a tua escrita corrosiva e militante. Vivemos tempos difíceis, como sempre, e tenho dúvidas quanto ao facto de sermos nós, os insurrectos, a tentar mudar o mundo e os seus costumes. Isso dependerá também de governantes, poderes e sistemas, da capacidade que têm de analisar a situação política e social. Há muito boa gente que não pretende revolução alguma, já que isso interferiria com os seus interesses e valores mais intemporais. Parece que tudo tem de mudar para ás vezes ficar na mesma, como dizia Lampedusa.
Este artigo é um bom manifesto, mas acho que deves aprimorar as tuas ideias, torna-las mais concretas e socialmente aplicáveis.
De resto, concordo com quase tudo o que dizes. Mas aponto só um senão: a tua linguagem instiga a realização de acto violentos. Pelo menos, é o que me parece.
Mas posso estar completamente errado.
Um grande abraço,
espero poder ler os teus próximos artigos