Artigo de Opinião
HONRAS DO PANTEÃO PARA MIM E PARA TI
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João Luís Tavares
Nunca gostei de futebol, confesso, mas gosto de toda a política que vem com o desporto. Todo o infinito espetáculo de acusações de corrupção, toda a brejeirice disfarçada de boas graças sociais, todo o deboche mascarado. Numa boa medida, o futebol português é a metáfora perfeita para a sociedade e para a política portuguesa. Portanto, é natural que a transladação do Eusébio seja o evento do ano para alguém que goste de dar alfinetadas em Portugal, e eu adoro dar alfinetadas (não em Portugal… Alfinetadas no geral…).
A transladação do Eusébio não só constitui todo um espetáculo político detalhadamente elaborado para dar circo ao povo (pão + circo = povo feliz, receita dos romanos) como constitui uma imagem perfeita do que é a situação portuguesa no que diz respeito à genialidade portuguesa. Sabem, o Panteão foi concebido como meio de honrar a memória de pessoas verdadeiramente geniais; e por mais que me digam que os golos do Eusébio eram mágicos jamais se compararão com os versos de Sophia, as peças de Garrett, a valentia de Humberto Delgado ou mesmo ainda com o som de Amália Rodrigues. Com este triste espetáculo de provincianismo estamos não a elevar o estatuto de um, mas a denegrir a imagem de muitos que realmente louvaram, mudaram, e fizeram avançar este país. Por algum motivo, o dia de Portugal é dia de Camões e da Língua Portuguesa, e não dia do Eusébio e dos jogadores de futebol que elevam o nome de Portugal. E o Cristiano? Longa vida tenha ele, mas o fim é igual para todos. O que lhe acontecerá? Se fosse a ele já estava a encomendar as placas para colocar na morada final. “Aqui jaz Cristiano Ronaldo. Pai, Futebolista, sepultado aqui porque alguém teve a brilhante ideia de que tentar meter uma esfera num paralelepípedo sem uma das faces com os pés é suficiente para ser considerado génio.”
Não estou a ser mau (estou um bocadinho…), mas acho toda a pompa com que tratamos os mortos um pouco triste. É como se tivéssemos um fetish com a morte, e temos… Porque não tratar os vivos com a pompa com que tratamos os mortos? Quando foi a última vez que se produziram todos para os vossos namorados? Se calhar eles já mereciam… Produzam-se como se fossem ser sepultados no Panteão, porque, quem sabe, um dia isso possa ser motivo para ser sepultado lá. Eu já escolhi o fato.
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