Política

MORTE À PENA DE MORTE

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A pena de morte ou pena capital é um tipo de sanção criminal, na qual o Estado tira a vida a uma pessoa como forma de condenação por um crime.

O termo capital deriva da expressão latina capitalis, que significa ”referente à cabeça”, aludindo à decapitação. No entanto, este não é o único método a que se recorre. As formas como se leva a cabo esta pena vão desde electrocussão, enforcamento, câmaras de gás, apedrejamento, injeções letais, entre outros.

A pena de morte é considerada pela Amnistia Internacional como ”uma punição extrema, degradante e desumana”, independentemente do método utilizado.  Esta organização considera ainda este tipo de prática discriminatório, sendo muitas vezes utilizada como arma de arremesso contra adversários políticos e minorias.

Fonte: Amnistia Internacional

Além disso, a pena de morte levanta o problema de ser irrevogável, acarretando por isso o permanente risco do assassinato de um inocente.

Os defensores da pena de morte, advogam que é um bom método de combate à criminalidade e que se distingue de métodos arbitrários de eliminação de pessoas, uma vez que a sentença e respetiva execução resultam da aplicação de uma lei conforme com as regras de um processo de justiça criminal ou militar.

André Lamas Leite, especialista em Ciências Jurídico-Criminais, em entrevista ao JUP, classificou a pena capital como “imprestável”, desde logo por questões éticas e possibilidade de erro judiciário.

Acrescentou ainda que “por via do artigo 40º, nº 1, do Código Penal, o que também decorre da Constituição, o nosso sistema penal serve para proteger bens jurídicos e para, na medida do possível, reintegrar o agente de um crime na sociedade. Esta última função das penas e das medidas de segurança nunca pode ser atingida através da pena capital”.

André Lamas Leite denota a existência de “estudos criminológicos que apontam para alguns Estados dos EUA que reintroduziram a pena de morte, e que só viram uma diminuição da taxa de criminalidade nos primeiros tempos da sua reintrodução, sendo que, pouco tempo depois, a mesma passou para níveis habituais antes da pena de morte. Daí que, mesmo de uma perspectiva puramente utilitarista e pragmática, também a pena capital prova não funcionar”.

No entanto, ainda que não exista qualquer prova de que este método seja mais eficaz que outras punições na redução do crime e que seja considerada por muitos Estados como obsoleta, a pena de morte persiste.

Em 2016, os relatórios da Amnistia Internacional documentavam 57 países que mantinham a pena de morte nas suas práticas, 30 que a mantinham nas suas leis, mas não a praticavam há mais de 10 anos e 7 que mantinham a pena de morte para crimes praticados em tempo de guerra.

Só no ano passado foram executadas, pelo menos, 1032 pessoas. Ainda assim, a Amnistia registou uma diminuição de 37% em relação a 2015, ano em que se registou o maior número de execuções desde 1989.

Mais de metade destas execuções foi praticada pelo Irão, que juntamente com a Arábia Saudita, o Iraque e o Paquistão perfizeram 87% do total. O Iraque triplicou as suas execuções, enquanto o Egipto e o Bangladesh duplicaram as suas.

Estes números aumentariam caso fossem contabilizadas as execuções praticadas na China, que a Amnistia estima em, pelo menos, 1000. No entanto, os dados referentes a este tema são considerados segredos de Estado.

Fonte: Amnistia Internacional

Apesar da sentença de morte contra menores ser um crime para o Direito Internacional, a Amnistia relata que, no ano passado, pelo menos duas pessoas foram executadas no Irão por crimes cometidos, enquanto ainda tinham menos de 18 anos.

Também no Bangladesh, Indonésia, Irão, Maldivas, Nigéria, Paquistão e Papua Nova Guiné, permanecem no corredor da morte pessoas que ainda não perfizeram 18 anos. Também pessoas com desordens mentais ou intelectuais foram executadas em países como a Indonésia, o Japão, as Maldivas, o Paquistão e os Estados Unidos da América.

A pena de morte é usada em crimes considerados menos graves pela comunidade internacional, em inúmeros países: China,  Malásia, Singapura, Emirados Árabes Unidos, Vietname, entre outros, aplicam a pena capital a crimes relacionados com drogas.

No Paquistão, a blasfémia dá direito à morte, enquanto na Arábia Saudita são executados os espiões e os raptores. A Amnistia afirma ainda que na maioria dos países onde se verifica a pena de morte, os julgamentos não são justos, de acordo com os padrões internacionais.

Fonte: Amnistia Internacional

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pela Assembleia-geral da Nações Unidas em Dezembro de 1948, reconhece a cada pessoa o direito à vida e afirma categoricamente, no seu artigo 5º, que “ninguém deverá ser submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes”.

Atualmente, na União Europeia, nenhum país pratica a pena capital. Em Portugal, a Constituição da República Portuguesa consagra que a vida humana é inviolável e que, em caso algum haverá pena de morte.

Portugal começou um processo percursor de abolição da pena de morte em 1852, quando num ato adicionado à Carta Constitucional, D. Maria II aboliu a pena de morte para crimes políticos. Em 1867 foi abolida para crimes comuns. Em 1890, a pena capital foi abolida em todo o território nacional e ultramarino.

E repare-se que, mesmo antes disso, esta pena não era aplicada no nosso país há alguns anos. O professor recorda que “a última execução de que temos notícia terá ocorrido em 1834 para um crime político e em 1846 para um delito comum. O Ministro da Justiça de então, Barjona de Freitas, desempenhou um papel essencial no processo e a votação na Câmara foi muito expressiva, com 90 votos a favor e 2 contra. Portugal foi saudado vivamente por várias personalidades que viveram em finais do século XIX, em especial pelo escritor e filósofo francês Victor Hugo”.

Questionado sobre o perigo de a pena capital ser reinserida no ordenamento jurídico português, Lamas Leite responde: “A questão não tem estado na agenda política dos decisores e não se conhece qualquer iniciativa junto da Assembleia da República ou de outros órgãos de soberania nesse sentido, desde a sua abolição. Com uma pequena interrupção, mas só para crimes estritamente militares, durante a nossa participação na I Guerra Mundial, Portugal não mais tem questionado a reintrodução da pena de morte. Julgo existir um muito amplo consenso na comunidade jurídica e na sociedade civil em geral, no sentido da negação dessa pena cruel e bárbara que é a pena de morte.»

O professor contou ainda que costuma abordar a questão da pena capital com os seus alunos: ”As respostas têm sido invariavelmente e de modo unânime opostas à pena de morte, pelo que me parece ser um assunto pacífico entre os estudantes. Fico sempre muito feliz com esse resultado. Mesmo quando tentamos realizar debates sobre o tema, os grupos a quem é distribuída a tarefa de defender a existência dessa pena, os argumentos que esgrimem são sempre com muito pouca convicção.”

Relembrou ainda que em 2009, a Faculdade de Direito da Universidade do Porto recebeu um condenado a pena de morte nos EUA, Joaquín José Martinez, de origem hispânica, que esteve anos à espera da execução e que, depois, conseguiu provar que estava inocente.

“A sua história foi deveras tocante, ouvimo-la com lágrimas nos olhos”, contou André Lamas Leite.

Nesse mesmo ano, em entrevista ao Público, Martinez contou que quando chegou à prisão “tinham queimado um homem, um ou dois meses antes, na cadeira eléctrica. Nos filmes perguntam-lhes o que é que querem para a sua última refeição, não é? Na realidade, não querem nem comer”.

O ex-condenado lembra que, da sua cela, via os condenados caminharem para a execução: “Choravam e tremiam. Urinavam-se enquanto caminhavam”

Por fim, o professor referiu o elogio do poeta, estadista e ativista pelos direitos humanos, Victor Hugo: “Está pois a pena de morte abolida nesse nobre Portugal, pequeno povo que tem uma grande história. (…) Felicito a vossa nação. Portugal dá o exemplo à Europa. Desfrutai de antemão essa imensa glória. A Europa imitará Portugal. Morte à morte! Guerra à guerra! Viva a vida!”

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