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MÁRIO CENTENO NO EUROGRUPO: O CARGO, AS CONSEQUÊNCIAS E OS DESAFIOS

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Mário Centeno, ministro das finanças português, foi empossado presidente do Eurogrupo na passada sexta-feira, dia 12.

A votação que originou a eleição aconteceu a 4 de dezembro num contexto atípico e com inúmeras curiosidades à mistura, a começar pelo facto de Mário Centeno suceder a Jeroen Dijsselbloem, ministro das finanças holandês que afirmou em outubro passado que “não se pode gastar em mulheres e álcool e, depois, pedir ajuda”, numa referência direta aos países do sul da Europa e aos recentes problemas económicos que estes enfrentaram.

Depois das polémicas declarações, Portugal posicionou-se na linha da frente do combate a Jeroen Dijsselboem, solicitando em diversas situações a sua demissão, argumentando que o seu discurso evidenciava um pensamento “racista, xenófobo e sexista” em relação aos povos em causa que se sentiram “ofendidos”.

Foi mesmo Dijsselboem o primeiro a anunciar a vitória de Mário Centeno, ainda antes de qualquer votação ser feita. À entrada da reunião do Eurogrupo que procedeu à decisão final, o ainda responsável pela pasta garantiu em declarações aos jornalistas: “Sou presidente do Eurogrupo até 12 de janeiro e a 13 de janeiro Mário Centeno toma posse”. Pedindo logo de seguida para que não o citassem em relação ao tema. A eleição viria a ser consumada horas mais tardes, após duas rondas de votações: na primeira, um dos 9 países que havia garantido o voto em Mário Centeno recuou deixando o ministro das finanças português com 8 votos e a 2 da vitória.

Na segunda ronda e após a desistência de Peter Kazimir, da Eslováquia, e Dana Reizniece-Ozola, da Letónia, Mário Centeno conseguiu ser eleito; uma vitória que muitos consideram ser um virar de página, já que o novo líder é originário de um país recentemente intervencionado, acabado de sair do procedimento por défice excessivo, com a dívida pública classificada como “lixo” e que há um ano atrás enfrentou a ameaça de aplicação de sanções devido ao incumprimento das metas macroeconómicas.

Mas, afinal, o que é o Eurogrupo e o que vai fazer Mário Centeno?

Aquando da eleição de Mário Centeno, muitos dos seus adversários políticos tentaram desvalorizar a sua eleição, recorrendo ao argumento de que este órgão não possui qualquer poder de decisão relevante para o destino económico e financeiro da Zona Euro.

Em parte, esta afirmação é verdadeira, uma vez que que este mecanismo se trata de entidade meramente informal e cuja atividade consiste na discussão e na chegada a acordos sobre a moeda única, uma vez que só estão representados neste conselho os países da Zona Euro.

Existe, mensalmente, uma reunião onde os 19 ministros das finanças devem marcar presença e à qual Mário Centeno não pode, a partir de sexta-feira passada, faltar. Aliás, esta é uma das suas principais funções: assegurar a preparação das reuniões de forma a que nenhuma decisão repentina possa pôr em causa os consensos necessários para a implantação de políticas monetárias estruturantes. Nas reuniões mensais estão também presentes o vice-presidente da Comissão Europeia com a pasta do euro, o comissário dos Assuntos Económicos e Financeiros, o presidente do Banco Central Europeu e o diretor do Mecanismo Europeu de Estabilidade.

Convém ainda referir que Eurogrupo é um organismo relativamente recente – criado em 2005 – pelo que o seu menor poder de influência e de decisão também pode resultar deste facto. Nos 18 anos de existência, a pasta de presidente do mecanismo só pertenceu a três pessoas, já a contar com Centeno: o luxemburguês Jean-Claude Juncker, atual presidente da Comissão Europeia e Jeroem Dijsselbloem.

Quais são as principais consequências para Portugal?

Logo após a sua eleição, Mário Centeno procurou deixar bem claro que a sua eleição em nada alterava o rumo definido para as políticas económicas portuguesas: “Esta eleição na política interna em Portugal na verdade não muda nada” – afirmou.

Mesmo assim, foram várias as personalidades e entidades que tentaram estabelecer uma ponte entre o contexto interno e o externo, a começar pelo PSD, que optou por destacar o “aumento de responsabilidade para Portugal”, dado que “quem preside a esta instituição é o guardião das regras europeias”. Centeno, por sua vez, corrobora este argumento divergindo apenas nas palavras escolhidas: “um novo patamar de exigência” – é assim que o novo líder dos ministros das finanças da Zona Euro opta por descrever.

Se a tomada de posse de Mário Centeno coincide com o início do ano de 2018, este ano promete também ser um ano determinante para a economia portuguesa e para a afirmação do caminho de recuperação português.

Com um crescimento na ordem dos 2%, com um défice surpreendentemente menor e com as instituições internacionais cada vez mais confiantes, o governo português está na mão dos fatores externos para que este crescimento seja consumado ou não. A ameaçar a saúde das finanças está a dívida pública e a dívida privada, pelo que as muito faladas reformas estruturais são cada vez mais necessárias e urgentes.

Que dificuldades vai enfrentar Mário Centeno no exercício do cargo?

Qualquer cargo que signifique uma abrangência tão grande de influência e poder está naturalmente associado a elevado número de dificuldades. Mário Centeno até pode ter chegado a líder do Eurogrupo num momento de crescimento económico, quer a nível nacional, quer a nível europeu, mas o Brexit, a instabilidade política na Alemanha e o fim do programa grego podem criar dificuldades.

Igualmente importante é o aprofundamento da união económica e monetária, algo que a acontecer significaria a criação da figura de um presidente das Finanças para a Zona Euro bem como a fusão do cargo de presidente do Eurogrupo com o de comissário europeu. Desta forma, assistiríamos a um reforço e concentração de poder numa só figura ao contrário da dispersão atual. Numa perspetiva semelhante, coloca-se a possibilidade da criação de um Fundo Monetário Europeu que seguiria as regras do Fundo Monetário Internacional e que funcionaria como um Tesouro Europeu.

O próprio órgão a que Mário Centeno atualmente preside é alvo de muitas críticas devido à falta de transparência nas tomadas de decisão, realidade que ainda é agravada pelo facto de o organismo não constar formalmente em nenhum dos tratados europeus, embora o seu poder seja determinante nas tomadas de decisão que envolvem o setor monetário, principalmente após a crise de 2008.

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