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GRETA THUNBERG: O PRESENTE É DELA

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Greta Thunberg, apesar de só recentemente ter completado 16 anos (ou, se calhar, precisamente por isso) é uma das figuras mais inspiradoras da actualidade. Ela lidera o movimento ambientalista #fridaysforfuture, jornada semanal de protesto que mobilzou, no passado dia 15 de Março, manifestações de jovens um pouco por todo o mundo, inclusivamente em Portugal.  Um dia antes, a 14 de Março, foi anunciado que Greta será candidata ao Prémio Nobel da Paz deste ano. O futuro permanece uma incógnita, mas o presente já é de Greta.

Uma Thor com pele de Heidi

A aparência física de Greta Thunberg encaixa na perfeição num certo modelo pré-concebido de adolescente nórdica, que habita o imaginário ocidental: olhos doces, rosto tranquilo, boechechas rosadas, uma subtil placidez de movimentos e o inconfundível par de tranças loiras a cair-lhe nos ombros, capaz de enternecer até o ser mais macambúzio. Tudo isto embrulhado num gigantesco oleado amarelo berrante, que ela veste, sempre que necessário, para se proteger do frio que faz na Suécia, a sua terra natal, e que se transformou na sua imagem de marca.

Desengane-se, porém, quem optar por avaliar a jovem pela sua tenra idade ou aspecto exterior inofensivo. Assim que tem a oportunidade de tomar da palavra, Greta transforma-se numa força demolidora em defesa das suas convicções ambientalistas, tornando-se então mais próxima de Thor e dos faen vikings, do que da Heidi que conhecemos dos filmes de infância. O presidente do Conselho Europeu, Claude Juncker, por exemplo, já provou da fúria da pequena jovem quando, numa sessão que teve lugar no Parlamento europeu, a 21 de fevereiro, em que Greta foi convidada a intervir, a ouviu dizer que «nós não queremos falar com os políticos», frase que provocou aplausos dos presentes e até sonoras gargalhadas carregadas de paternalismo, mas Juncker permaneceu imóvel. Talvez ele suspeitasse o que aí vinha, que a jovem continuaria a manejar com destreza o seu mjölnir (martelo mitológico) para malhar na hipocrisia da classe política. Segundo ela, se nada se fizer, os governantes actuais ficarão conhecidos como «os maiores vilões de todos os tempos, porque decidiram não escutar e não agir», acrescentando, num comentário às novas metas de redução da emissão de CO2 propostas pela União Europeia, que «os políticos actuais optam por varrer o problema para debaixo do tapete».

Greta, que se define a si própria como uma activista ambiental, é assim mesmo: curta, directa, mas quase sempre certeira. Num outro discurso que proferiu em Katowice, na conferência UN Climate Change COP24, perante uma plateia repleta de líderes mundiais, foi porventura ainda mais longe ao afirmar: «Vocês dizem que amam os vossos filhos e no entanto estão a roubar-lhes o futuro, mesmo defronte dos seus olhos!»

Do piso gelado da Praça Mynttorget aos principais palcos da política mundial

Conhecer os feitos de Greta começa a ser matéria de cultura geral. A 20 de Agosto de 2018, a menina decidiu iniciar sozinha um protesto na Praça Mynttorget, em Estocolmo, onde está localizado o parlamento sueco, com o objectivo de forçar o governo do seu país a cumprir as metas dos Acordos de Paris. Dito assim não parece muito promissor. As praças das cidades de todo o mundo estão repletas de protestantes solitários que se sentam no chão, a olhar o vazio, amparados por cartazes com mensagens eloquentes, mas que ninguém lê. Greta, no entanto, embora conduzida por um impulso pessoal, conseguiu dar voz, através da sua acção, ao sentimento real de milhões de jovens espalhados por todo o mundo, inconformados por se verem herdeiros de um planeta em decomposição acelerada e praticamente à beira do colapso ambiental – ou «este fardo insuportável que estão a deixar às crianças», como ela lhe chama, governado por adultos irresponsáveis, hipócritas e criminosos.

Nas semanas que se seguiram a esse dia inaugural de protesto em plena Praça Mynttorget, ela persistiu na acção de luta e, quando o ano lectivo começou, despoltou um movimento que se veio a designar ‘greve escolar pelo clima’ ou #fridaysforfuture. Todas as sexta-feiras, ela e outros colegas faltam às aulas, reunindo-se junto ao Parlamento sueco e noutras cidades europeias para reivindicar a aplicação de políticas climáticas. No entanto, o princípio que anima estes jovens não se reveste de qualquer optimismo relativamente à possibilidade de ocorrer uma mudança efectiva no actual quadro político e geracional.  Quando Greta se dirigiu aos líderes mundiais, em Katowice, ela disse: «Não viemos aqui para suplicar que se preocupem . Vocês ignoraram-nos no passado e vão continuar a ignorar. (…) Viemos aqui para vos dizer que a mudança chegou, quer gostem quer não gostem».

Greta exige que se fale claro, acusando os líderes mundiais de não terem a maturidade necessária para dizer as coisas como elas são (ela, que tem apenas dezasseis anos…). «Nós não estamos a lutar pelo futuro da nossa geração. Estamos a lutar pelo futuro de todos» e há um diagnóstico calamitoso que é urgente transmitir ao público em geral: «a nossa civilização está a ser sacrificada para que um grupo muito reduzido de pessoas possa colher benefícios, continuando a obter lucros gigantescos», sublinha ela. «A biodiversidade está a ser sacrificada para que os ricos possam viver luxuosamente».

A jovem tímida que vai ser candidata ao Nobel

No dia 15 de Março, milhões de adolescentes e jovens estudantes, espalhados por centenas de cidades e mais de setenta países, juntaram-se num protesto cujo pontapé de saída, ainda que remoto, se pode situar naquela agora longíqua manhã de Agosto de 2018, em que a jovem estudante se dirigiu até às imediações do parlamento sueco. Greta, a quem há quatro anos foi diagnosticado síndroma de Asperger, mostra-se incrédula com tudo o que se está a passar. «Eu fui sempre aquela rapariga da parte de trás da sala que está permanentemente em silêncio», disse ela, numa entrevista ao The Guardian.«Nunca pensei que pudesse fazer a diferença».

Há quatro anos, Greta sofreu de depressão e, segundo ela, foi a receptividade que as suas preocupações ambientais começaram a ter junto da sua família, que a ajudaram a recuperar. «Pensei: é uma enorme perda de tempo sentir-me assim, porque há tanta coisa boa que posso fazer com a minha vida».

Desde então não mais parou. Em poucos meses, passou a ser seguida por quase um milhão de utilizadores no instagram, inspirando centenas de milhares de pessoas a tornarem-se, como ela, activistas em prol do clima. Aparentemente, o seu exemplo gera consenso até na classe dirigente, como se viu recentemente em Portugal, nas reacções dos líderes políticos às manifestações de 15 de Março (com a não totalmente surpreendente excepção de Ferreira Leite), devendo-se salvaguardar, porém, que essas reações possam conter um certo grau de paternalismo geracional da classe dirigente para com os mais jovens. Na verdade, todos os protagonistas da mudança social são polémicos, geram anticorpos e críticas e Greta não é excepção. Num artigo recente, publicado no Le Figaro, Laurent Alexandre, um eminente médico francês, acusa a jovem de se deixar manipular por grupo extremistas.

Quem não se deixa intimidar pelas críticas, nem adoçar pelos políticos é a jovem sueca e seus apoiantes. «O verdadeiro poder pertence ao povo»,  diz ela. Veremos se a história lhe dá razão. Para a próxima sexta-feira, entretanto, já se sabe: novo protesto está marcado. «Comecámos a limpar a porcaria que vocês fizeram e só vamos parar quando tivermos terminado». Palavra de Greta.

 

Artigo de Miguel Marques Ribeiro. Revisto por Ana Rita Moutinho.

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