Política
Rui Moreira avança com pedido de instrução do Caso “Selminho”
O Jornal de Notícias avançou no dia 26 de janeiro que Rui Moreira já deu entrada com um pedido de instrução do caso, que ainda se encontra no DIAP do Porto.
O Caso “Selminho”
Foi no passado dia 18 de Dezembro de 2020 que Rui Moreira foi acusado pelo Ministério Público de incorrer num crime de prevaricação. De acordo com o “Notícias Magazine”, o despacho do Departamento de Investigação e Ação Penal Regional do Porto “concluiu que o autarca atuou deliberadamente contra a lei, obrigando o município aos interesses da Selminho, com a única intenção de beneficiar a empresa de que o próprio arguido, seus irmãos e sua mãe eram sócios”.
De acordo com a TVI24, o MP solicitou a perda de mandato do autarca usando como apoio para tal pedido a lei das incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos, defendendo ainda que Rui Moreira tinha a completa noção que não estava a agir em conformidade com o cargo público que ocupa.
Segundo o Observador, a acusação do DIAP Regional do Porto “considera que Moreira incorreu num conflito de interesses neste caso em que a empresa imobiliária Selminho, da sua família, tentou construir um edifício de apartamentos num terreno da escarpa da Arrábida que, além do mais, era em parte propriedade do Município”.
Origens da acusação remontam a 2001
A acusação contra Rui Moreira, apesar de ter surgido de surpresa, já não é novidade nenhuma no panorama político portuense. De acordo com o Público foi há 19 anos, no dia 31 de Julho, que a Selminho, “sociedade detida em 5% pela mãe de Rui Moreira e em 95% por uma sociedade constituída pelo presidente e sete irmãos” comprou o dito terreno, uma parcela situada na Calçada da Arrábida, a Maria Irene Pereira Ferreira e João Baptista Ferreira, um casal a quem o mesmo havia sido registado a seu favor em maio do mesmo ano, depois de estes garantirem que o adquiriram em 1970 a Álvaro Nunes Pereira.
No ano seguinte, a Selminho solicitou um pedido de informação prévia e viu-lhe ser atribuída direitos de construção no terreno ao abrigo das Normas Provisórias. A entrada em vigor de um novo Plano Diretor Municipal em Fevereiro de 2006 impossibilitou a construção nesses terrenos, contrariando o pedido de informação prévia feito em 2002.
Cerca de 8 anos depois, a Câmara Municipal do Porto (já com Rui Moreira na Presidência) e a Selminho chegaram a um acordo extrajudicial onde se pôs a possibilidade de se rever o PDM de 2006 e acolher assim “as pretensões da empresa”.
CDU fez queixa ao MP
O acordo feito pelo Município e a empresa da família Moreira foi revelado pela CDU/Porto numa reunião camarária em Julho de 2016, que em Outubro do mesmo ano anunciou que iria avançar com uma queixa perante o Ministério Público e a Direção-Geral das Autarquias Locais, de acordo com o Expresso. Aquando da denúncia dos comunistas, o mesmo jornal noticiou que o autarca portuense declarou que iria proceder a uma queixa perante a Procuradoria-Geral da República “contra desconhecidos sem escrúpulos que, anonimamente, espalharam dúvidas sobre o acordo alcançado entre o município e a Selminho”.
O parecer de um técnico superior da Câmara em Dezembro de 2016 concluiu que os planos de construção da Selminho abrangiam cerca de 1621 metros quadrados dum total de 2400 metros quadrados pertencentes à empresa, supostamente, desde 2001, embora não exista nenhum documento que prove a alienação por parte da autarquia. Em Abril de 2017, a Câmara solicitou que fosse um juiz a presidir ao tribunal arbitral que deveria resolver o conflito caso a nova versão do PDM não favorecesse as ambições da companhia.
Da decisão do MP á do Supremo Tribunal
Em Julho do mesmo ano, na mesma notícia em que abordou a queixa da CDU contra Rui Moreira, o Expresso também declarou que o Ministério Público arquivou a mesma. O próprio autarca, numa nota enviada á imprensa, declarou que no entendimento do MP “após investigação, que não existiu ‘qualquer sinal de proveito pessoal do autarca visado ou de terceiros ou de prejuízos patrimoniais para a autarquia, por não ter sido clarificado que hajam sido violados os deveres de respeito pela legalidade administrativa, que enformam o ‘munus’ das suas funções, suscetível de pôr em causa o seu desempenho isento e íntegro’”.
O “Caso Selminho” parecia estar encerrado, até que em Julho de 2019 a Polícia Judiciária realizou buscas na Câmara Municipal do Porto no âmbito do mesmo. De acordo com o Observador, a autarquia acabou mais tarde por confirmar que os inspetores da PJ recolheram “comunicações eletrónicas e documentos urbanísticos relacionados com processos antigos”, afirmando que colaborou com as autoridades e que nenhum “responsável político ou funcionário em funções” foi constituído arguido.
Apesar do MP ter arquivado a queixa da CDU/Porto houve uma continuidade da polémica, quando um funcionário da Câmara do Porto declarou que o terreno da imobiliária da família Moreira se sobrepunha a uma propriedade municipal. No início desse ano, o Tribunal Judicial do Porto considerou como “nula a escritura da venda do terreno” feita pelo casal Ferreira à Selminho em 2001. Tanto o casal como a imobiliária recorreram da decisão para a Relação do Porto em Fevereiro.
O Observador também noticiou que os juízes desembargadores do Tribunal da Relação do Porto confirmaram em Outubro do mesmo ano a decisão da primeira instância, considerando no acórdão “que não ficou provado que o terreno tenha sido adquirido pela família que o vendeu à Selminho, nem que alguém o possa reivindicar por usucapião.” As partes recorreram ao Supremo Tribunal, que em Maio de 2020 confirmou a decisão da Relação.
Rui Moreira recusou abandonar funções e estranha timing
O “Notícias Magazine” comunicou que aquando duma reunião pública do Executivo camarário a 21 de Dezembro, o autarca recusou abandonar as suas funções. Rui Moreira diz estranhar o “timing” em que a acusação do DIAP Regional do Porto foi feita, sendo “uma acusação muito estranha, tanto no conteúdo como no momento em que é deduzida”, recordando que os factos não são propriamente novos e lamentando que o tema regressasse um ano antes das eleições autárquicas.
Ao Observador, Rui Moreira declarou que não deixa de assinalar que a dita acusação “é completamente descabida e infundada”, afirmando que “os factos agora usados são exatamente os mesmos que já tinham sido analisados pelo Ministério Público que, em meados de 2017, considerou não existir qualquer ilicitude” no seu comportamento. Afirmou, no entanto, estar “absolutamente tranquilo” e que não vai deixar “de tudo fazer para que sejam apuradas todas as responsabilidades”.
De acordo com o Público, os responsáveis envolvidos no “Caso Selminho” garantiram perante o Ministério Público e a Polícia Judiciária que o autarca portuense não deu nenhuma ordem para a resolução do conflito, embora não saibam explicar quem é que deu as ordens ao advogado do município e aos dirigentes camarários para avançarem com um acordo que acabaria por se revelar favorável para com a família de Moreira, segundo a tese da acusação.
Artigo da autoria de Leonardo Pereira. Revisto por Marco Matos e José Diogo Milheiro.