Política
Médio Oriente: Irão ameaça continuar a desenvolver plano nuclear
No dia 26 de fevereiro Biden autorizou a primeira ofensa militar da sua administração: militares americanos realizaram um ataque aéreo contra milícias apoiadas pelo Irão na Síria. A investida foi ordenada em resposta a ataques contra os EUA no Iraque (país que é alvo de grande influência iraniana desde a invasão americana de 2003), afirma o Pentágono.
O Programa Nuclear Iraniano (PNI)
A ameaça de desenvolvimento nuclear do Irão, um dos países, a nível geopolítico, mais importantes do Médio Oriente, tem assombrado as grandes potências mundiais há anos. As relações voláteis e instáveis com o Ocidente têm contribuído ainda mais para tornar tal decisão iraniana num problema político premente.
O PNI foi lançado em 1950, com a ajuda dos Estados Unidos, como parte do Programa Átomos para a Paz. O Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP), em vigor desde 1970, proíbe o desenvolvimento deste tipo de armas, embora garantindo o direito de explorar e utilizar a tecnologia nuclear, desde que para fins pacíficos.
Antes da Revolução Islâmica de 1979, o governo americano apoiava o Irão e os seus planos de desenvolvimento da tecnologia nuclear. Mas após a revolução, o governo do Aiatola Khomeini decidiu abandonar temporariamente o programa, apenas para voltar a lançá-lo, com menor assistência ocidental.
O programa é hoje gerido pela Organização de Energia Atômica do Irão e inclui diversos centros de pesquisa, uma mina de urânio, um reator nuclear, entre outros. O país sempre afirmou, no entanto, que o seu programa nuclear é pacífico e que nunca tentou desenvolver uma bomba nuclear.
Acordo Nuclear Multilateral
Depois de o Irão se ter recusado a suspender o seu programa de enriquecimento de urânio, em 2006, a comunidade internacional aplicou sanções económicas severas, que fizeram as exportações de petróleo entrar em colapso e a moeda depreciar, criando um efeito inflacionário descontrolado.
O Plano Conjunto de Ação (PACG), de 2015, visava restringir a capacidade do país desenvolver armamento nuclear, prevendo as sanções económicas a aplicar em caso de incumprimento. Em troca da suspensão dessas sanções, o Irão aceitou limitar as atividades nucleares e permitir a inspeção de fiscais internacionais, como a realizada pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), pertencente às Nações Unidas.
Estados Unidos, Reino Unido, França, Alemanha, China e Rússia (conhecidos como P5+1) foram os países signatários do plano diplomático conjunto, e tentaram mantê-lo vivo – com exceção de um.
Trump abandona acordo
Em 2018, o presidente norte-americano abandonou unilateralmente o plano, com a intenção de forçar o Irão a negociar um novo acordo que impusesse mais restrições ao programa nuclear. Reestabeleceu então as sanções ao país, incluindo ao setor petrolífero, e acusou Teerão de ser a origem de todos os problemas do Médio Oriente.
Uma grave recessão no país e a fuga de empresas estrangeiras do Irão foram causadas pelas novas sanções aplicadas por Washington.
Recusando-se a negociar um novo plano, o país do Médio Oriente tem incumprido o acordo desde aquele ano. Em declarações oficiais, acrescentou que continuaria a cooperar com a agência nuclear da ONU, a AIEA, e que poderia voltar a cumprir as normas do acordo caso os seus interesses fossem garantidos e as sanções retiradas.
Estopim
Em Janeiro de 2020, o Irão anunciou o fim do cumprimento total das restrições impostas pelo acordo nuclear, após a morte do general Qasem Soleimani, atingido por um drone americano. O governo iraniano disse que não cumpriria mais as limitações de sua capacidade de enriquecimento de urânio, estoque de material enriquecido ou pesquisa e desenvolvimento.
Em contraponto, o ex-presidente norte americano expressou sua indignação pelo Twitter:
Corrida contra o tempo
Teerão espera agora que Joe Biden reverta as sanções impostas por Trump. Caso contrário, o país ameaça impedir os inspetores da agência das Nações Unidas de fiscalizar as instalações do programa nuclear, segundo nova lei parlamentar, no que seria o seu maior passo contra o pacto até então.
O novo presidente americano afirma ter a intenção de retornar à diplomacia com o país, que se encontra congelada desde 1980. ‘‘Se o Irão voltar a cumprir estritamente os compromissos sob o PACG, os EUA farão o mesmo’’, dizia a nota conjunta dos países do P5+1, sob a afirmação de que seria ‘’perigoso’’ se o Teerão limitasse o acesso de inspetores internacionais às suas instalações nucleares.
Pedindo que ‘‘o Irão não tome nenhum passo a mais’’, os países europeus afirmaram partilhar o objetivo de fazer o Irão voltar a cumprir o acordo de 2015 de maneira integral. Por seu lado, o líder supremo iraniano Ali Khamenei afirmou que quer ‘‘ações e não palavras’’. Enquanto isso Biden diz querer ‘‘encontrar uma solução mutuamente viável’’.
O líder iraniano afirmou ainda que revogaria o Protocolo Adicional do Acordo Nuclear a 23 de fevereiro, mas que manteria as inspeções da Agência Internacional de Energia Atômica ao país, afirmando, mais uma vez, que ‘‘não há lugar para armas de destruição em massa’’ no seu programa de defesa do país.
‘‘O que é necessário agora são gestos americanos concretos que realmente mostrem ao Irã que os EUA estão se afastando da política de pressão máxima do mandato de Trump”, afirma a especialista no Irão, Ellie Geranmayeh.
Artigo da autoria de Maynara Gonçalves. Revisto por José Milheiro e Marco Matos.