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CÂMARA DO PORTO QUER GARANTIR ESPAÇOS DE HABITAÇÃO NO CENTRO HISTÓRICO

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O anúncio foi feito pelo vereador da Habitação e Ação Social do Porto, Manuel Pizarro, durante a terceira conferência sobre “Políticas Públicas de Habitação”, no Palacete dos Viscondes de Balsemão, na Praça Carlos Alberto.

A sala estava cheia para ouvir os dois arquitetos da cidade do Porto, Alexandre Alves Costa, que é professor jubilatus na Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto (FAUP) e Jorge Figueira, professor na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra.

Falava-se sobre o futuro, o amanhã das casas do Porto. A problemática das “Ilhas”, habitações sociais, guetos e como combater a desertificação e ruína foram os temas em cima da mesa moderada por Manuel Pizarro. Acima de tudo, o objetivo do debate, que contou com a participação do público através de questões, foi perceber qual o papel da arquitetura na ajuda à resolução destes problemas sociais.

Como combater a desertificação e ruína da cidade?

O cenário é contrário ao que se vivia há 25, 40 anos atrás, logo após o 25 de Abril: atualmente, as estatísticas mais recentes do INE (2011) referem que existem cerca de 700 mil casas que não estão habitadas em todo o país. Mas, a verdade, é que se continua a ter “centenas de milhares de famílias que não vivem em condições de dignidade”, explicou Manuel Pizarro.

Esta realidade está bem presente no Porto, uma cidade onde moram mais de 200 mil pessoas e das quais mais de um terço tem mais de 65 anos, sendo que a maior parte dos idosos moram sozinhos.

Um tema largamente discutido no Porto e trazido por Manuel Pizarro e pelo público, diz respeito às 964 “ilhas”, onde moram cerca de 12 mil pessoas. O vereador da Habitação e Ação Social afirma que se está “muito longe da extinção das «ilhas»”, vistas por muitos como um “mal a exterminar” e defende que há necessidade de se “olhar para a questão de frente”, procedendo ao “reuso, novo uso e até à substituição, quando assim se justificar”. “Não podemos imaginar que as «ilhas» possam ser casas com futuro?”, questionou.

A “lição das «ilhas»” que Alexandre Alves Costa acredita que se deve reter é o sentimento de “interajuda”. Não há velhos solitários. O velho tem uma vizinha que lhe vai todos os dias levar a comida, tem um vizinho que o leva à casa de banho”, ou seja, problema da solidão nas “ilhas” não existe. “Um sítio que tenha casas pequenas vai ter obrigatoriamente uma relação intensa entre novos e velhos”, afirma. Quem quer as casas da câmara é, então, “quem não tem outra alternativa”, explica.

“É no mix entre a conectividade entre as classes e entre as faixas etárias que se encontrará o futuro da habitação”, acrescenta Jorge Figueira.

O antigo arquiteto da Câmara do Porto, Alexandre Alves Costa, admite a ausência de movimentos sociais urbanos que “deem o norte” e sejam “específicos sobre a questão da cidade e da casa”. Existem, sim, muitos movimentos sociais de “natureza política, mais gerais”, critica.

Para terminar com a desertificação e ruína da cidade, Alexandre Alves Costa defende o “estudo de áreas de intervenção” (“unidades operacionais”), que “devem ter potencialidades para o realojamento total das populações carenciadas e até, talvez, novos moradores”. Cada unidade definida rigorosamente, “deve ser um projeto conjunto, uma espécie de plano de pormenor com futuras intervenções de arquitetura e construção, garantindo a prossecução dos interesses de toda a comunidade” e segundo o acordo de todos os moradores.

Atualmente, Jorge Figueira acredita que se vive um programa “low-cost”, onde se faz primeiro e só depois é que se pensa, por isso, “mais do que um programa é preciso um modelo de ataque, de resposta”, mas que não pode cometer os mesmos erros do passado.

Por isso, o arquiteto fala que “os engenheiros têm um papel fundamental” e “devem ser chamados a intervir de imediato”, mas “têm de conhecer a história”.

O papel dos arquitetos na resolução dos problemas sociais

Jorge Figueira compara o arquiteto a um pintor: “alguém cuja capacidade de abstração o coloca num mundo fabulado” e o olhar para estas questões como o olhar para uma tela. “Passar da tela para a ação” é o que, na sua opinião, Alexandre Alves Costa tem feito ao longo da sua vida.

É difícil, no entanto, integrar este panorama no dia-a-dia. “Estamos a falar de uma tela do tempo do Photoshop, estamos a falar de um programa do tempo do Facebook”, acrescenta.

Alexandre Alves Costa defende que o grande desafio do arquiteto é respeitar a realidade, pois “não se deve deitar nada abaixo”. Em vez disso, há que recriar e dar asas à criatividade para resolver os problemas que surjam e os que já existem.

“Cruzando estes programas variados com a realidade – temos ilhas e temos prédios abandonados no Porto, nós arquitetos saberemos, seguramente, trazer a pintura das telas para a ação, para o terreno”, afirma o professor da Universidade do Porto.

Para Jorge Figueira, a estratégia que visa a construção de casas com futuro tem de ser a da “oportunidade, exemplo, experiência fragmentada, a do imediato”. Defende, por isso, o “risco na teoria e prudência na prática”.

“A tela está pintada, mas está tudo por fazer”, afirma Jorge Figueira, que pede: “Venham daí essas casas, que nós nos encarregaremos de lhes encontrar um futuro!”.

“Nós só falamos nestas liturgias que a câmara organiza, mas, depois, quando se passa para o dia-a-dia, não somos chamados”, deixou no ar Alexandre Alves Costa. O arquiteto defende que se podia “constituir uma comissão de homens bons, como se fazia na Idade Média, para dar um conselho aos novos”, como se fossem seus filhos.

O arquiteto Jorge Figueira estabeleceu dois tipos diferentes de programas para a habitação que criam alguma tensão na resolução destas questões: o do arquiteto que “tem sempre estética” e algo que está nas entrelinhas e o político que não tem estética e move-se, “principalmente, por outros fatores, todos eles muito legítimos e defensáveis”.

As novidades que a câmara está a propor para contornar o panorama

Manuel Pizarro destacou também a importância de prestar atenção aos riscos da pressão acrescida do turismo no centro histórico do Porto. De  1971 até 2011, a população passou para menos um quarto, de 34 mil para nove mil pessoas, “antes da invasão turística”, acrescenta. No entanto, afirma que não se pode culpar o turismo pela desertificação do centro histórico.

Recorde-se que a Câmara do Porto anunciou em julho a intervenção de cerca de 4 milhões de euros na reabilitação e construção de novas casas no centro histórico, com vista a repovoar a zona com mais 130 famílias nos próximos dois anos. A escala a que estão a trabalhar é “ainda muito limitada”, segundo Pizarro: 57 casas estão quase prontas e 17 edifícios estão a aguardar uma reabilitação mais demorada. No entanto, “é a primeira vez que isso acontece”, sublinha.

Manuel Pizarro fez questão de anunciar que, “pela primeira vez em largos anos”, esta quinta-feira, 29 de setembro, a câmara exerceu o “direito legal de preferência na aquisição de um imóvel no centro histórico” da cidade. O imóvel em questão foi colocado à venda na Rua do Comércio. “Há duas ou três alienações [transferência de propriedade] por semana e a câmara vai passar a exercer frequentes vezes o seu direito de preferência, de modo a garantir que há espaços de habitação no centro histórico” não segregados, como aconteceria se fossem entregues apenas “ao mercado do turismo e à mercantilização da função de habitação”.

Outra das novidades anunciadas pelo vereador, neste caso, para a reunião de câmara da próxima terça, foi a alteração dos estatutos da empresa municipal de habitação. A Domus Social vai passar a ter “objetivos mais ambiciosos de promoção de políticas de habitação para a cidade”, ou seja, ir além das limitativas da habitação social e criar áreas de intervenção onde o estímulo público é essencial. Assim, surge um “movimento de regeneração urbana, que em muitas áreas da cidade é essencial para poder garantir o acesso à habitação condigna às pessoas e fazê-lo sem que isso signifique a construção de novos guettos”.

Os problemas que surgem

Do público, surgiu a ideia de ocupar as cerca de 700 mil casas que não estão habitadas com os cerca de 800 munícipes que estão em lista de espera. O vereador da Habitação e Ação Social considerou que “os programas de construção de habitação dos últimos anos que conduziram às centenas de milhares de fogos não utilizados são suficientemente irracionais para serem difíceis de contornar pelo abuso”, ou seja, o governo anterior “tentou fazer um programa de reutilização de casas devolutas nas mãos dos bancos”.

O vereador lembrou ainda a “burocracia infernal” do programa de financiamento comunitário Portugal 2020, que acha que foi “mal feito”. O programa poderia servir para resolver os problemas sociais e de habitação, mas “não corresponde às efetivas necessidades dos objetivos  enunciados à escala europeia”: “promover desenvolvimento económico inteligente, promover a coesão social e uma sociedade ambientalmente mais sustentável”.

Manuel Pizarro destacou ainda a importância de haver um estímulo do público para que participe destas questões e fez até um desafio para descobrirem novas “ilhas” e comunicarem à câmara, uma vez que estão escondidas atrás das ruas e, por vezes, não são fáceis de identificar.

A próxima conferência sobre “Políticas Públicas de Habitação” acontece a 10 de novembro, no Auditório Isabel Alves Costa, no Porto.

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