Sociedade
QUANDO A FÉ, O AMOR E OS SORRISOS SE UNEM
A iniciativa
Entre as ruas movimentadas da Índia, surge um projeto chamado Expo’14 Unity World Cup, um torneio de futebol entre vários países. Tudo começou no início de dezembro de 2014.
Quando Pedro se aventurou nesta viagem, o objetivo era participar no torneio, a representar Portugal e, por outro lado, poder transmitir a fé cristã a crianças. Para isso, realizava várias atividades e ajudava-as no seu desenvolvimento desportivo através de treinos. Assim, teve a sua primeira tentativa na Índia.
Liderado por Kennedy D’Silva, um indiano cristão, o projeto avançou. Inspirado pelas ferramentas fornecidas pelo projeto ReadySetGo, quis ver o desporto, neste caso, o futebol, ligado com a fé pessoal em Deus. O projeto ReadySetGo consiste num conjunto de métodos e ideias que relacionam o desporto com a fé e que tornam possível a utilização de um meio como o desporto para transmitir a fé. Assim, tudo se torna simples como Ready (Preparar), Set (Apontar) e Go (Ir).
Os participantes deste evento tinham que ser “praticantes ou ex-praticantes de futebol que estejam em forma para integrar uma equipa”. Pedro é um ex-jogador de futebol, federado. Um dos clubes que integrou, quando era jogador, foi o Leça Futebol Clube. Os portugueses foram convidados a participar, em conjunto com mais cerca de 7 países. A organização disse-lhes que não tinham que pagar quaisquer despesas de viagem e que tinham direito a certas condições. Na realidade, não foi isso que encontraram: as condições eram precárias. Os percalços durante as viagens e a estadia foram imensos. Contudo, Pedro Chibante afirma que essa situação não foi importante para o desenvolvimento da experiência em si, pois aquilo que obteve da mesma superou as dificuldades vividas.
O dia-a-dia
Pedro conta que os indianos os receberam de uma forma bastante calorosa: autógrafos eram pedidos e as pessoas olhavam para eles como se fossem celebridades. Foi necessário criar medidas de segurança para permitir que os jogadores, onde Pedro se incluía, pudessem passar. Apesar disto, conhecer o povo indiano foi um privilégio para todos os que participaram neste projeto. Inicialmente, os participantes estiveram na segunda cidade mais pobre da Índia, Hyderabad, com cerca de 12 milhões de habitantes e depois viajaram para Goa, para continuarem o projeto.
A rotina repetia-se dia após dia. Os jogadores portugueses tinham treinos em equipa onde se preparavam para o torneio. Tinham, também, os vários jogos de qualificação para os quais dedicavam algum tempo. Desenvolveram as chamadas “clínicas”, onde estavam com as crianças: tinham alguns treinos de futebol, com algumas “brincadeiras”. Após este convívio, partilhavam um pouco da sua fé em Deus e de como podem ter uma relação pessoal com Ele. As crianças tinham entre os 6 e os 12 anos.
Durante a aventura, fizeram uma viagem para Goa para continuarem o torneio e conviveram com mais crianças. A viagem foi de 640 km, cerca de 16 horas de viagem de autocarro. Pedro fala sobre o facto dos participantes, como jogadores de futebol, estarem à espera de um tratamento diferente. Ainda assim, diz não arrepender-se de nada. Admite, também, ter criado expectativas no início, mas sabe que lhe deram “tudo o que tinham e o que não tinham” e, por essa razão, sente-se grato pela experiência.
As crianças
As crianças indianas são, em muito, diferentes das portuguesas e esse aspeto foi marcante para quem as acompanhou. Em culturas diferentes, o desenvolvimento social acaba por ser diferente também e isto foi demonstrado ao longo do projeto. Pedro conta que tanto as crianças como os adultos eram um pouco reservados. No entanto, estes mostraram-se sempre muito prestáveis.
“No desporto não temos que falar a mesma língua para termos interação e podermos comunicar”
As crianças já sabiam que jogadores de futebol iam estar com elas. Para Pedro esta atitude foi crucial no relacionamento com elas, pois foi possível criar, com maior facilidade, uma ligação e ter uma comunicação mais pessoal: histórias, sorrisos e aventuras. Uma experiência que contou com altos e baixos e vidas de crianças transformadas pelo contacto com pessoas que se preocupavam e que tentavam mostrar o quão especiais elas são. É, com certeza, fácil afirmar que o sorriso foi a grande recompensa de toda esta aventura. “É muito fácil ver a expressão e os sorrisos nas crianças e os nossos”.
O Jêrome
“Quero mencionar um rapaz que nos ficou no coração: o Jêrome. Ele fez o que podia e o que não podia.” Ao longo de uma vida dedicada ao serviço, Jêrome foi sempre uma pessoa incansável para com os outros.
As peripécias foram imensas, as lutas também. Mas se há característica que Jêrome tem é a de ser prestável e de estar pronto a servir a qualquer momento e a qualquer um. Pedro e os jogadores portugueses queriam comunicar com os seus familiares, mas não o conseguiam fazer, pois não tinham Internet no telemóvel. Durante dois dias, Jêrome forneceu os seus dados móveis para 21 pessoas. Ao fim destes dois dias, os voluntários aperceberam-se que não era normal ele ainda ter Internet. Descobriram, então, que Jêrome carregava o seu telemóvel para que os outros pudessem utilizar.
Tinha cerca de 19/20 anos e era um “anjo” para quem lá estava. Esforçava-se para fazer tudo o que era necessário e para ajudar no máximo que conseguisse. Pedro conta ainda que certo dia pediram um favor a Jêrome: algo simples e que tinha algum tempo para ser feito. Nesse mesmo momento, ele sai a correr e percorreu cerca de 5 quilómetros a pé para realizar o favor que lhe tinham pedido. “Estou aqui para servir”: era o mote de Jêrome.
Depois da viagem que os portugueses realizaram para Goa, o jovem indiano surpreendeu com uma visita inesperada para apoiar e acompanhar um dos jogos em que Portugal participou. Mostrou a todos que a amizade ultrapassa qualquer barreira de cultura ou diferenças. Uma pessoa, com uma vida humilde, num país com muitas dificuldades, foi capaz de tocar os corações de mais de duas dezenas de pessoas.
As pulseiras
“Muitas crianças pediam-nos pulseiras. Muitos de nós tinham a pulseira dos 4 Pontos, agora conhecida como os The Four. Pedro Chibante explicou que a pulseira é uma ferramenta que ajuda a entrar em contacto com as pessoas que não estão familiarizadas com a ideia de fé e de Deus. Consiste em 4 pontos que explicam a essência da mensagem que quer ser transmitida.
Segundo Pedro, este é o significado de cada ponto: o Coração exemplifica que Deus ama todos e que o Seu amor é “incondicional”; o Sinal de divisão representa o facto do ser humano criar uma barreira entre ele e Deus, “falhando o alvo de Deus” para a vida de cada um; a Cruz demonstra que, mesmo existindo uma barreira, Deus decidiu eliminá-la ao levar Jesus até à cruz para morrer por cada um de nós; o Ponto de Interrogação coloca cada pessoa a questionar sobre o assunto de querer ou não ter um relacionamento com Deus.
Era esta a mensagem que era transmitida às crianças durante os momentos que passavam com elas. É uma mensagem diferente da que é passada em maior parte dos programas de voluntariado. No projeto, decidiu-se que era relevante comunicarem aquilo que era mais importante para si enquanto equipa. Acima de tudo, tratava-se duma mensagem de amor, algo que une qualquer incentivo de solidariedade.
A Experiência Pessoal
“Eu acho que nós deixamos um pedacinho de nós em cada canto que estivemos.”
A História escreveu-se entre os sonhos daquelas crianças e de quem as conheceu. Como em todas as histórias, a despedida não é desejada. As crianças sentiam que precisavam de algo que mantivesse este grupo de voluntários perto delas. Sempre que os jogadores portugueses se deslocavam para o autocarro (depois de cada jogo), as crianças, do lado de fora, pediam para lhes darem algo que as relembrasse dos momentos que viveram. Podia ser algum objeto que se tornasse numa memória daquela grande aventura.
O pedacinho que foi deixado pelos participantes no projeto foi, certamente, menor, comparado com o que estes receberam. “Uma coisa muito básica e superficial que me marcou para a vida é que nunca mais me vou queixar daquilo que me é posto em cima da mesa.”
Pedro acredita que viver num país subdesenvolvido é completamente diferente daquilo que Portugal, enquanto um país desenvolvido, está habituado a imaginar. Nunca a imaginação poderia acompanhar tal realidade.
“Nós conseguimos ligar-nos a coisas tão fúteis, tão superficiais e tão de momento. Com a minha experiência na Índia consegui ver a felicidade das pessoas. Eles ligavam a outras coisas que nós aqui em Portugal não sabemos ligar. Ligavam à amizade, ao contato direto com a pessoa, a servir a pessoa e isso é fantástico!”
Pedro chegou à Índia com a mala cheia e voltou com ela ainda mais cheia, mas desta vez de coisas diferentes. Deu sapatilhas, chuteiras, roupa e trouxe para casa sorrisos e gratidão que, para ele, não encheu só uma mala, mas um coração: “são mundos diferentes mas nós podemos complementar-nos.”
O jovem pensa que dedicar-se completamente aos outros é o que de melhor há nestas aventuras. E mesmo para quem não acredita em Deus, Pedro mostra que há uma mensagem que é transversal a todos: “Amar o próximo é a frase indicada”.
A fé, o amor e os sorrisos uniram-se para escrever uma história diferente. Uma história que é, unicamente, de quem a escreveu. Vidas foram transformadas e memórias foram criadas. Uma história escondida que, a partir de hoje, é conhecida por todos.