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Sociedade

MEERU: Ajudar a abrir os braços de um país

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“Na MEERU | Abrir Caminho, existe um foco central — as pessoas que encontramos: pessoas que nos ensinam, pessoas que nos fazem acreditar, pessoas que sonham” Fonte: MEERU

A MEERU – Abrir Caminho é uma jovem associação criada em 2019, que destaca uma Missão central de existência: “promover o diálogo e a proximidade para desenvolver Comunidades e responder às urgências do mundo”. Agora com quase dois anos de existência, a associação já conta com muitos voluntários, parceiros e histórias cunhadas a idiomas vários.

Entre os vários projetos da instituição,  destacam-se o “MEERU Convida Amigos”, que é uma série de encontros entre organizações, especialistas, ativistas e voluntários; o “MEERU Aproxima”, que é um conjunto de redes de suporte informal para combater o isolamento de migrantes, refugiados e requerentes de asilo; e as “Comunidades de Impacto”, que engloba atividades de sensibilização e transformação social para a comunidade.

A associação não presta apoio técnico, fazendo antes a ponte entre as famílias e entidades especializadas quando se trata de resolver uma questão burocrática. A MEERU pretende estar presente na integração das famílias na realidade local, criando uma rede coesa de voluntários de modo a que a seja recíproca, pacífica e imersiva. É o que conta Nicolau Osório, um dos co-fundadores que aceitou o convite para uma entrevista com a esperança de que esta conversa faça chegar o projeto a quem dele precisa.

Como surgiu a motivação para a criar um projeto com este público-alvo?

Em 2017, estive seis meses em Atenas como voluntário pela PAR (Plataforma de Apoio aos Refugiados) e contactei com este público. Para além disso, estive lá a trabalhar com o Pedro, o atual presidente da MEERU, responsável por juntar as primeiras sete pessoas que fundaram a associação. Quando voltámos, tinhamos uma motivação muito grande em ser ativistas cá, um sentimento, aliás, comum a quem faz uma missão deste tipo.

Na altura tinha acabado o curso e sabia que queria envergar na área social, só não estava certo quanto à temática. O projeto em concreto surgiu muito graças à experiência da Isabel, uma rapariga que tinha também feito missão.

A Isabel é de Barcelos e faz parte do grupo de jovens de lá. A certa altura, um grupo religioso acolheu uma família de Refugiados que foram ajudados por estes jovens e com quem estabeleceram uma relação muito profunda. Até hoje esta família contacta conosco e faz parte do nosso núcleo próximo. Este simples contacto levou a que quiséssemos formar uma rede para estas pessoas.

Foi precisamente num café que se desenvolveu a ideia. Inicialmente, a Isabel falava em construir um projeto e o Pedro queria muito criar uma associação para intervir nas escolas, juntando as duas coisas começamos a conceber o projeto.

Em três ano de existência quais as maiores dificuldades sentidas no desenvolvimento da MEERU?

Na verdade, tivemos sempre muito apoio apesar dos já esperados entraves.

Uma das sete pessoas que faz parte da associação trabalhava na Fundação Gonçalo da Silveira ( FGS), uma outra trabalhava num polo em Lisboa ligado à Comissão Europeia e outro membro, sendo jurista, ajudou também a tratar de questões burocráticas. Tivemos muito apoio também de outras entidades, das quais destacamos o IPAV que nos cedeu um escritório e, dada a experiência que tem, ajudou-nos ainda com as candidaturas. O IPAV era quem geria a PAR na altura em que fui voluntário.

A Universidade Católica do Porto é também uma parceira que nos tem vindo a acompanhar e, por iniciativa nossa, já realizamos lá dois eventos. Depois, fomo-nos descobrindo e construindo a MEERU através dos vários projetos -principalmente focados na intervenção nas escolas e comunidades – que lhe deram forma, e fundamos a nossa missão.

Ficamos quase um ano a construir o “MEERU Aproxima” e fomos mesmo muito apoiados. Não queremos ser de todo uma organização que trabalha sozinha.

Uma vez que a associação é constituída por jovens, alguma vez sentiram que foi mais difícil serem levados de modo sério?

Sim, mas acho que isso foi muito bom no início porque deu-nos uma necessidade muito grande de ter tudo bem estruturado. Era um medo presente que nós tínhamos, mas chegamos a uma certa altura em que começamos a fazer coisas bem, desmistificando isso e usamos a juventude a nosso favor.

Em muitas ocasiões sentimos que as pessoas eram condescendentes conosco, mas, por outro lado, outras também ficavam admiradas pelo facto de sermos jovens e fazermos algo bem estruturado. Sentimos que a juventude é uma arma.

Que apoios ainda faltam para acautelar uma família que chega ao nosso país?

Há necessidade de uma rede de suporte informal. O que está previsto com o acolhimento a estas famílias é muito técnico e não há uma estrutura de natureza informal que, por sua vez, o complemente. A primeira e maior barreira para quem cá está é a língua e há muito poucas inciativas para colmatar esta falha.

Na verdade, as associações que acolhem estas famílias não têm que dar aulas de português, mas promovê-las e garantir que este é um direito deles. Temos um exemplo de uma mulher que estava a residir em Barcelos e que tinha que se dirigir continuamente a Braga para ter aulas de português. Sem este requisito da língua, torna-se também problemático conseguir emprego, e este obstáculo impacta muitas outros setores da quotidiano destas pessoas.

Para além disso, a habitação é também uma problemática neste domínio que é fulcral para as pessoas se autonomizarem.

Lado a lado com a questão da empregabilidade, surge também a dificuldade na integração cultural que dificulta do processo. Ainda há pouco tempo nos chamaram para ajudar uma família em Barcelos que chegou ao final do programa – estas famílias, quando chegam, são apoiadas por um programa durante um ano e meio, e nenhuma das pessoas do agregado está empregada, nenhuma delas fala português. Uma rapariga de 18 anos queria entrar na faculdade e não conseguiu, não tendo havido qualquer evolução desde que chegaram. Neste momento, querem mudar de casa mas não têm noção nenhuma do mercado imobiliário e do que implica essa mudança.

Vivem numa bolha diferente porque nunca ninguém rebentou a bolha cultural para os integrar.

Para além de apoiar migrantes, Refugiados e requerentes de asilo, pretendem também sensibilizar e formar os locais para esta temática. De que forma o fazem?

O projeto “MEERU Aproxima” tem três eixos grandes e um deles é a sensibilização da comunidade através dos voluntários. Para nós, faz muito sentido capacitar pessoas da comunidade que vivam perto das famílias que queremos ajudar.

Os voluntários fazem parte das equipas de proximidade ou seja, após serem capacitados vão acompanhar uma família durante oito meses, apoiando-a de modo informal, fazendo visitas regulares onde conversam, fazem companhia e ajudam em coisas sem teor técnico, como ir ao supermercado. Este apoio existe muito na base do “estar”.

O segundo eixo expressa-se nos eventos comunitários sendo que há dois tipos: uns em que somos nós a dinamizar e outros que são dinamizados pelas próprias famílias.

Arrancamos com este projeto durante a pandemia, e o objetivo é que durante os oito meses a família se comprometa a dinamizar um evento para a comunidade com a ajuda dos voluntários como se fosse um género de pay back da família à comunidade que os ajuda. Chegamos a fazer uma atividade em que aprendemos a cozinhar umas bolachas típicas muçulmanas e correu muito bem.

Por último, temos a sensibilização de agentes locais, quer seja em contexto escolar, quer seja seja em contexto comunitário, porque é importante perceber que o senhor do talho vai conviver com estas pessoas tanto quanto a Presidente que trata das questões burocráticas, e todas precisam de ser sensibilizadas para o tema.

A ideia é que os próprios voluntários envolvam a comunidade partindo de uma sensibilização indireta da rede à volta destas pessoas. Por exemplo: por vezes os voluntários levam os namorado(a)s ou os irmãos às visitas, havendo uma envolvência mais profunda entre os locais e as famílias.

Como é que qualquer pessoa pode ajudar e chegar a estas pessoas?

Desde logo, se estivermos a trabalhar nas cidades ou perto do local de residência das pessoas, podem ser voluntárias no “MEERU Aproxima”. Em segundo, acho que as pessoas se devem informar, não só através das notícias, das redes ou de artigos que leiam, mas contactando diretamente com estas pessoas, conhecendo-as, ouvindo a história delas, já que há famílias acolhidas por Portugal inteiro. Conhecer as pessoas e a sua realidade é já uma grande ajuda.

Artigo da autoria de Márcia Branco. Revisto por Amanda Silva.