Artigo de Inês Silva. Revisto por Alexsyane Amanda R. Silva e Laís França.
Sociedade
Portugal tem uma das taxas mais altas de suicídio nas cadeias da Europa
Em 2019, registaram-se 64 mortes nos estabelecimentos prisionais e 11 foram por suicídio. Já no ano passado, 21 reclusos decidiram pôr término à vida, num período em que se contabilizaram 75 mortes nas prisões em Portugal. Os dados do mais recente Relatório Anual de Segurança Interna confirmam a tendência de aumento registada nos últimos anos.
Quanto aos óbitos por doença, os serviços prisionais realçam “o envelhecimento progressivo da população prisional” e o aparecimento de doenças de elevada morbilidade “que afetam parte dos reclusos à entrada no sistema prisional”.
No panorama europeu, Portugal é dos países com a taxa de suicídio mais elevada. As Estatísticas Penais Anuais do Conselho da Europa comparam a situação prisional nos 47 países-membros e são publicadas em relatórios anuais relativos à situação dos dois anos anteriores. De acordo com o relatório mais recente, referente a 2019 e 2020, a taxa de suicídio nas prisões portuguesas é de 11,2%, mais do dobro da média europeia (5,2%).
As medidas portuguesas para prevenção do suicídio em meio prisional
Em Portugal, foi implementado em 2010 o Programa Integrado de Prevenção do Suicídio (PIPS) que tem como objetivo a deteção precoce de sinais e de sintomas de alerta/risco de suicídio em reclusos. O programa prevê também a sinalização eficiente para presos em cumprimento de pena privativa de liberdade.
Por outro lado, só a 27 de Novembro de 2018 é que se realizou a primeira formação para a prevenção de suicídios nas cadeias. O curso organizado pela Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP) teve como público alvo comissários e chefes dos estabelecimentos prisionais e foi ministrado por técnicos de saúde mental e psiquiatria no Hospital de São João de Deus, em Caxias.
João Marques Teixeira, psiquiatra e professor na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCEUP), considera que a condição de recluso, em personalidades mais frágeis e limite, “é por si suficiente para gerar descompensações psíquicas que, por sua vez geram, descompensações comportamentais”. Num artigo para a Revista Científica Nacional,“Saúde Mental nas Prisões”, João Marques Teixeira afirma que, atualmente, os estabelecimentos prisionais são “grandes depositários de indivíduos que necessitam de uma abordagem específica no âmbito da psiquiatria”.
As dificuldades da reintegração social
Mesmo após o cumprimento parcial ou total da pena, a reintegração social é um processo complexo que envolve muitas dificuldades para o indivíduo e para a comunidade. O psiquiatra Miguel Cotrim Talina explica que uma saúde mental vulnerável no recluso “limitará, seguramente, a utilização dos recursos pessoais e a capacidade de beneficiar dos apoios neste processo”.
O psiquiatra escreveu na sua tese de Doutoramento que o investimento em cuidados para os problemas de saúde mental “poderá ter um efeito multiplicador nos resultados obtidos a curto e a longo prazo”. Miguel Talina considera, ainda, que a aplicação de recursos nesta área será uma ferramenta importante para consolidar a pena de prisão como uma “oportunidade reabilitadora”.
Na Nova Zelândia já existe um projeto nomeado “The Intervention and Support Project” que constitui uma nova abordagem na prevenção do suicídio nos estabelecimentos prisionais. O Departamento de Correção (Department of Corrections) recebeu 11,6 milhões de dólares para financiar este projeto piloto que apresenta um novo modelo de cuidados a reclusos mais vulneráveis. O programa tem uma abordagem “mais terapêutica”, e as novas equipas incluem psicólogos, enfermeiros especializados em saúde mental e terapeutas ocupacionais.
De acordo com o Governo neozelandês, o objetivo do projeto é “dar esperança aos reclusos”, não só ajudá-los no imediato, mas sim “trabalhar em novas formas para melhorar o seu bem-estar a longo prazo”.