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Israel e Palestina: A tensão que voltou a explodir

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Um território para dois Estados 

Para compreender a génese das tensões que marcaram as últimas semanas, é necessário recuar à ordem mundial do pós-Segunda Guerra. Em 1947, uma resolução da ONU previa a criação de dois países, através da divisão do território da Palestina: um Estado judaico (Israel) e um Estado muçulmano (Palestina). O processo da fundação de Israel não foi pacífico: em 1948, mais de 700 mil palestinianos foram expulsos das suas casas ou fugiram. 

A ocupação do território atribuído à Palestina teve início em 1967, quando Israel passou a abranger Jerusalém, a Península de Sinai, a Cisjordânia e a Faixa de Gaza. O conflito armado, conhecido como a “Guerra dos Seis Dias”, opôs, pela terceira vez, israelitas e árabes. Desde aí que os palestinianos residentes  vivem sob o controlo militar de Israel, algo que muitos consideram ser uma forma de colonialismo.

As tensões entre Israel, com a aprovação (ou inexistência de desaprovação) do Ocidente, e a Palestina, com o apoio do mundo árabe, foram uma constante nas últimas sete décadas. A revolta dos palestinianos refletiu-se numa série de levantamentos, com especial relevância da Primeira Intifada (1987-1993) e da Segunda Intifada (2000-2005). Às forças armadas de Israel opuseram-se populares e grupos político-militares organizados, como o Hamas, a Frente Popular para a Libertação da Palestina, a Organização para a Libertação da Palestina (OLP), ou a Fatah.

Os acordos de “paz” foram, em ambos os casos, mediados pelo Ocidente: a Primeira Intifada terminou com os Acordos de Oslo e com o reconhecimento do Estado de Israel pela OLP. A Segunda Intifada culminou nas decisões, por parte de Israel, da construção de um muro em redor da Cisjordânia e de um bloqueio económico e comercial à Faixa de Gaza, depois da vitória do Hamas nas eleições parlamentares do território. No final de 2008 e no verão de 2014 registaram-se as ofensivas militares mais mortíferas na Faixa de Gaza.

Hamas – o que é?

 

Criado em 1987, é um movimento islâmico palestiniano, de orientação sunita. É constituído por um braço filantrópico (Dawa), um braço político e um braço armado (Brigadas Izz ad-Din al-Qassam). Especialmente ativo em Gaza, que controla desde 2006, é um dos mais importantes movimentos islâmicos da Palestina. Os EUA, a UE, o Canadá, o Japão e Israel classificam o Hamas como um grupo terrorista.

 

Porquê agora?

As hostilidades entre Israel e o Hamas agravaram-se depois de semanas de tensão em Jerusalém, território sagrado para Judeus, Muçulmanos e Cristãos. Dezenas de palestinianos estão em risco de serem despejados do bairro de Sheikh Jarrah, na zona Este da cidade. As suas casas poderão ser entregues a judeus nacionalistas. Várias famílias palestinianas vivem neste bairro desde que fugiram das suas casas em 1948. Agora, organizações de colonos israelitas alegam que essas casas pertenciam anteriormente a grupos judeus e que, por isso, as famílias palestinianas deveriam ser expulsas – tiveram luz verde do governo de Israel.

Para além disso, durante o mês sagrado do Ramadão, deu-se uma série de ocorrências vistas pelos palestinianos como “altamente provocativas”. A polícia israelita invadiu a mesquita de Al Aqsa (terceiro lugar sagrado do Islão) em mais do que uma ocasião, incluindo em momentos de oração. As forças de Israel também encerraram uma praça da Cidade Velha de Jerusalém, que corresponde a um popular ponto de encontro para os jovens islâmicos durante o Ramadão. Os confrontos entre palestinianos e a polícia israelita multiplicaram-se.

Para o governo de Israel, as alterações graduais na dinâmica palestiniana foram uma surpresa. A estratégia de Benjamin Netanyahu, Primeiro-Ministro de Israel, assenta, e sempre assentou, na “continência”, e não na resolução – uma tentativa de transformar a situação da Palestina num tema de importância secundária no panorama político do país. 

Consequências

Ao longo de onze dias, o Hamas disparou mais de 4300 mísseis na direção de Israel, a maioria intercetados por um sistema antimísseis. Ao mesmo tempo, Israel bombardeou, por via aérea, cerca de mil pontos de Gaza – a elevada capacidade militar do exército de Israel é financiada, em grande parte, pelos EUA. Morreram doze israelitas, incluindo duas crianças. Em Gaza, morreram, pelo menos, 248 palestinianos, incluindo 66 crianças, e milhares de pessoas perderam as suas casas. 

Um cessar-fogo entrou em vigor no dia 21 de Maio, mas há dúvidas que prevalecem. O estancar da violência poderá ser considerado uma vitória, especialmente para o Hamas e para os palestinianos da Faixa de Gaza. Para Israel, a conclusão é outra: este não é um problema secundário, apesar do que os governos de extrema-direita que geriram o país na última década têm procurado insinuar. Entre os israelitas, verifica-se uma polarização das posições e uma deriva extremista do sionismo (ideologia que defende um Estado judaico). Uma sondagem citada pelo Canal 12 de Israel revela que 72% dos israelitas defendem a continuação dos ataques aéreos em Gaza. Para a comunidade internacional, torna-se evidente que o esquecimento não é uma solução.  

 

Vozes de apoio

Por todo o mundo, gritos de apoio à Palestina e contra a ocupação de Israel foram ouvidos. Em várias cidades dos EUA e da Europa, tiveram lugar manifestações de solidariedade por um povo massacrado – em Paris, Londres, Madrid e Copenhaga, por exemplo, milhares de vozes exigiram a libertação da Palestina, com registo de alguns confrontos entre a polícia e os manifestantes.

Em Portugal não foi diferente. No dia 17 de maio, ecoavam por Lisboa as palavras “Palestina Livre”. Ao mesmo tempo, no Porto, cerca de 500 pessoas, entre jovens portugueses, migrantes e estudantes internacionais, juntaram-se nas ruas em solidariedade ao povo palestiniano. A concentração foi convocada pela CGTP (Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses), pelo Movimento pelos Direitos do Povo Palestino e pela Paz no Médio Oriente (MPPM) e pelo CPPC – Conselho Português para a Paz e Cooperação (CPPC).

Em entrevista ao JUP, Ilda Figueiredo, presidente do CPPC e uma das responsáveis pela organização da manifestação, relembra que “o Estado da Palestina está a ser massacrado por Israel, que tem o apoio completo e integral dos Estados Unidos”. 

“Aqui, como em todo o mundo, houve estas concentrações de solidariedade a um povo que continua a ser massacrado. Foram dezenas e dezenas de crianças que morreram nos bombardeamentos. É algo inadmissível”.

As manifestações também incluíam uma mensagem para o Governo português. “Infelizmente, o Governo português coloca no mesmo prato da balança o agressor e o agredido”, refere Ilda Figueiredo, destacando a discrepância entre as situações dos dois Estados: “Os meios de defesa da Palestina são muito ténues comparados com os meios militares que Israel utiliza”.

Para a presidente do CPPC, a Constituição da República Portuguesa é muito clara: “A CRP defende a cooperação para a resolução de conflitos internacionais, e não o recurso à guerra. Aquilo nem se trata de um conflito. Trata-se de um país, Israel, que massacra e coloniza permanentemente um Estado, a Palestina”. Por isso, “estas manifestações também visam lembrar o Governo português que nós temos uma Constituição com posições muito claras que o Governo tem de assumir e respeitar”.

Sobre outras iniciativas, Ilda Figueiredo revela que na segunda-feira, dia 24 de maio, houve concentrações semelhantes em Braga e em Viseu. “Vamos continuar com estas campanhas de esclarecimento, porque é preciso esclarecer a opinião pública, mas também de repúdio pela atuação de Israel”.

 

Texto de Ana Mafalda Silva. Revisão por Beatriz Oliv. Ilustrações de Luna Schmidt.

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