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Assembleia Geral da ONU: Esperança, Multilateralismo e Polémica

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Johannes Eisele/Agence France-Presse — Getty Images

“Agora é o tempo de restaurar a confiança e inspirar esperança”. Foi assim que António Guterres abriu a 76ª Assembleia Geral das Nações Unidas. Realizada em Nova Iorque, a conferência juntou líderes e chefes de Estado dos cerca de 190 países que compõem as Nações Unidas.

O Secretário-Geral da ONU referiu, na sessão de abertura, que o mundo “nunca esteve tão ameaçado”, sublinhando as desigualdades socioeconómicas entre países. A crise pandémica contribuiu, de acordo com Guterres, para exacerbar as diferenças entre o mundo “desenvolvido” e “em desenvolvimento”, realçando-se a disparidade no acesso às vacinas. “Em vez do caminho da solidariedade, estamos num caminho sem fim para a destruição”.

O antigo Primeiro-Ministro português revelou-se preocupado com um conjunto de temas que dividem a ordem mundial, nomeadamente as alterações climáticas, a “guerra fria” entre os Estados Unidos e a China, o desrespeito pela paz e pelos direitos humanos, os contrastes económicos ou a desigualdade de género (dos 30 oradores agendados para o primeiro dia, contava-se apenas uma mulher, a Presidente da Eslováquia).

O dia inicial da Assembleia Geral ficou ainda marcado pelo primeiro discurso de Joe Biden perante a ONU e pela polémica que envolveu a participação de Jair Bolsonaro. O Presidente português também interveio.

Portugal no Conselho de Segurança?

Marcelo Rebelo de Sousa participou pela quarta vez na cimeira, com um discurso marcado pela defesa do multilateralismo: “A governação de um mundo multipolar exige compromisso e concertação entre as nações”. O Presidente da República português mencionou a recente crise pandémica, as crises económicas e sociais, e a situação no Afeganistão como evidência da necessidade de cooperação entre os diferentes países.

A ocasião foi aproveitada para lançar a candidatura de Portugal ao mandato de 5 anos, com início em 2026, no Conselho de Segurança. Marcelo Rebelo de Sousa pediu a confiança dos países-membros da ONU, destacando que “Portugal esteve, estará sempre, do lado dos consensos que resolvam as crises, do multilateralismo, das Nações Unidas”.

Dirigiu ainda críticas à atual organização do Conselho de Segurança, apelando a uma reforma que inclua o Brasil, a Índia e países africanos como membros permanentes: “Resistir às reformas significa enfraquecer o multilateralismo e criar situações de crise, com prejuízo para todos”.

Delegação brasileira recebida com protestos

Foi com críticas às medidas de controlo sanitário que Jair Bolsonaro se dirigiu aos restantes líderes presentes na Assembleia Geral. O Presidente brasileiro reiterou a defesa das terapêuticas rejeitadas pela ciência, como a hidroxicloroquina, em alternativa às políticas de confinamento e ao passaporte sanitário: “A história e a ciência saberão responsabilizar a todos” (referindo-se aos países e aos média que se posicionaram contra os tratamentos mencionados).

As declarações de Bolsonaro não foram o único motivo da polémica que envolveu a participação brasileira na cimeira. Apesar de apoiar a vacinação como meio de combate à Covid-19, o Presidente do Brasil recusa ser vacinado. Como o certificado de vacinação é exigido, em Nova Iorque, para entrar nos espaços de refeição, Bolsonaro e a restante comitiva brasileira foram obrigados a jantar na rua.

O som dos protestos, com a sugerida incompetência de Bolsonaro como palavra de ordem, foram música de fundo deste jantar e de todas as deslocações do governo brasileiro em Nova Iorque. O Ministro da Saúde do Brasil, inclusive, dirigiu-se aos manifestantes com agressividade. Poucos dias depois, testou positivo à Covid-19, tendo sido obrigado a ficar em isolamento nos Estados Unidos. Os restantes membros da delegação testaram negativo e regressaram ao Brasil, onde cumprem 14 dias de quarentena.

Governo talibã pede reconhecimento

A crise política e humanitária no Afeganistão foi um dos assuntos que marcou a Assembleia Geral. O governo talibã não reconhece os diplomatas de Cabul ainda em serviço, mas exigiu a participação na cimeira. Numa carta enviada a António Guterres, no passado dia 20, foi solicitada a intervenção do país com um novo embaixador, Suhail Shaheen.

A resposta não foi conhecida antes do final da Assembleia Geral, mas sabe-se que será dada por um comité diplomático. O novo governo ainda não foi reconhecido formalmente por nenhum país, desde que, em agosto, os talibãs tomaram o poder no Afeganistão.

Um “sim” das Nações Unidas seria um primeiro passo no reconhecimento internacional do novo regime afegão e na abertura do diálogo.  

 

Escrito por Ana Mafalda Silva

Revisão por Beatriz Oliveira

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