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Sociedade

O mundo fora da Europa: quais são os conflitos que existem atualmente?

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Créditos: Pexels / Pixabay

 

 

Guerra Civil Etíope (novembro 2020-presente)

A Guerra do Tigré, também denominada de Guerra Civil Etíope, começou no dia 4 de novembro de 2020 e até então ainda decorre. O governo federal da Etiópia começou uma operação militar contra a Frente Popular de Libertação do Tigré (FPLT), na região de Tigré (também denominada de Tigray), alegando que a FPLT tinha atacado uma base militar. Segundo oficiais da região, nunca houve um ataque.

Durante várias semanas, a região ficou sem serviços de eletricidade, telefone e Internet. A Amnistia Internacional (AI) fez pressão às autoridades nacionais etíopes para restabelecerem as comunicações uma que vez que os direitos e as liberdades dos cidadãos deveriam ser mantidos.

Segundo um relatório publicado pela AI no dia 18 de fevereiro de 2022, a FPLT “assassinou dezenas de pessoas de forma deliberada, violaram dezenas de mulheres e raparigas em grupo – algumas com apenas 14 anos – e assaltaram propriedades privadas e públicas em duas áreas da região de Amhara, no norte da Etiópia”. A AI relata ainda que os crimes ocorreram predominantemente entre agosto e início de setembro de 2021, aquando da ocupação da FPLT nas zonas de Chenna, Kobo e arredores, em julho desse ano.

Em Kobo, a FPLT argumenta que o ataque a civis se deveu a uma “retaliação devido à crescente resistência das milícias locais e de residentes armados”.

Tropas do Exército etíope após uma batalha. Créditos: Tiksa Negeri / Reuters

Sarah Jackson, diretora regional adjunta da Amnistia Internacional para a África Oriental, Corno de África e Grandes Lagos, declarou que “as forças de Tigray mostraram um total desrespeito pelas normas fundamentais do Direito Internacional Humanitário que todas as partes em conflito devem seguir. Desde julho de 2021, estão a surgir provas de que estas forças estão a cometer crimes de guerra e possíveis crimes contra a humanidade em áreas sob o seu controlo na região de Amhara. Isto inclui repetidos incidentes de violação generalizada, assassinatos e roubos, mesmo de hospitais”.

O relatório “Eu não sei se eles se aperceberam de que eu era uma pessoa’: Violações e Outra Violência Sexual no Conflito de Tigray” (em inglês, I Don’t Know If They Realized I Was A Person’: Rape and Other Sexual Violence in the Conflict in Tigray) revela a violência sexual que centenas de mulheres e jovens raparigas passaram por membros de diferentes forças: “Força de Defesa Nacional da Etiópia, da Força de Defesa da Eritreia, da Força Especial de Polícia da região de Amhara (ASF, na sigla em inglês), e do Fano, um grupo da milícia Amhara”, como consta na página noticiosa da Amnistia Internacional.

A Organização das Nações Unidas (ONU) tem acompanhado o conflito. No início do mês de fevereiro de 2022, o secretário-geral António Guterres apelou ao fim do conflito para garantir “o acesso humanitário efetivo e ajuda a toda a população afetada em toda a Etiópia”. Dias após esta declaração, a vice-secretária geral da ONU Amina Mohammed manifestou esperança no diálogo e no fim da guerra. A vice-secretária marcou presença na região de Tigré, após a Cimeira da União Africana que terminou a 6 de fevereiro. A Guerra Civil Etíope foi o principal tópico de discussão.

Amina Mohammed expressou total “solidariedade para com todos os etíopes”, como consta no site oficial noticioso da ONU. Segundo o artigo, a vice-secretária geral relatou “esforços do governo e do povo pela paz” e que a ONU vai manter “as exigências de assistência humanitária, fim de confrontos e de diálogo”. De acordo com dados da ONU, a Guerra Civil já provocou milhares de mortos e fez mais de dois milhões de refugiados. Cerca de 40% da população da região de Tigré sofre com a “extrema escassez de alimentos”.

Insurgência Naxalita (1967- presente)

Os naxalitas são membros de uma organização política defensora do maoísmo, doutrina comunista baseada nos ensinamentos de Mao Tse Tung, antigo líder da Revolução Chinesa e fundador da República Popular da China. O nome deriva de uma pequena aldeia na Bengala Ocidental, um estado no leste indiano.

Em 1967, os naxalitas começaram uma revolução camponesa. As suas reivindicações consistiam na luta pelos direitos dos camponeses à sua terra e na garantia de maior empregabilidade para trabalhadores agrícolas negligenciados. No entanto, a insurgência só começou a ganhar forma a partir de 2004, com a formação do Partido Comunista da Índia (maoísta). Os naxalitas focaram-se no conflito contra o governo indiano que resultou em centenas de mortos todos os anos.

O avanço do “Corredor Vermelho” (outra designação para a insurgência) tem ocorrido lentamente para o leste, centro e sul do país. Em 2005, o conflito já ocorria em metade dos 29 estados indianos. No ano seguinte, o ex-primeiro ministro Manmohan Singh, numa conferência dada no Centro Nacional de Artes Performativas indiano, descreveu a ação dos naxalitas como “o maior desafio de segurança interna no país”. Questionado acerca do uso da força aérea indiana, Manmohan garantiu que “a polícia e as forças paramilitares eram capazes de tratar do conflito”.

Áreas com atividade naxalita em 2007 (esquerda) e em 2013 (direita). Créditos: Wikipedia

Em 2010, a Organização das Nações Unidas descreveu a insurgência naxalita como “conflito armado”, mas a Índia discordou. O enviado indiano disse no Conselho de Segurança da ONU que “a violência perpetuada por esses grupos é completamente repugnante e condenável, mas não faz da zona um conflito armado definido pela lei internacional”. No entanto, a ONU acusou os naxalitas de recrutarem crianças até aos seis anos para combater. Dentro das várias acusações, surgem o uso de mulheres e crianças como escudos humanos e a violação de várias mulheres em zonas rurais e tribais indianas.

O conflito continua ativo e desde 2010 que os ataques têm aumentado, incluindo ataques bombistas. Nesse mesmo ano, no dia 6 de abril, os naxalitas lançaram o maior ataque que culminou no assassinato de 76 funcionários da Polícia Federal Indiana e no ferimento de outros 50. O último registo de atividade naxalita foi uma emboscada no dia 3 de abril de 2021 que resultou na morte de 22 seguranças indianos e 9 naxalitas. Cerca de 32 sofreram ferimentos após uma troca de tiros entre as forças de segurança e naxalitas em Bijapur de Chhattisgarh.

Guerra Civil na Somália (1991-presente)

A Somália tem sido um país gravemente afetado por crises políticas, sociais e ambientais. No dia 1 de julho de 1960, tornou-se independente do Reino Unido e, nove anos mais tarde, sofreu um Golpe de Estado liderado pelo Major-General Jalle Siad Barre. Com uma política baseada no tribalismo, a Somália conta com vários “senhores de guerra” que controlam as zonas em que está dividida. A Somalilândia foi o único estado que se autoproclamou independente, mas não foi reconhecido pela ONU.

Entre 1991 e 2000, existiu a tentativa de instalar diversos governos, mas a instabilidade causada pelo início da Guerra Civil em 1991 não o permitiu. As forças estatais entram em confrontos com os grupos rebeldes numa guerra que até hoje perdura. Apesar da intervenção de outras nações como os EUA, a guerra continuou a ser mortífera. Estima-se que o número de vítimas esteja entre os 700.000 e um milhão.

Divisão da Somália. Créditos: Wikipedia

Em 1993, iniciou-se a Operação das Nações Unidas na Somália (ONUSOM II) para desarmar as milícias. Segundo a ONU, no ano seguinte, morreram 24 capacetes-azuis paquistaneses. Em 2004, estabeleceu-se o Governo Federal de Transição da República da Somália, com o objetivo de controlar o conflito quando se formou o Conselho Supremo das Cortes Islâmicas. Esta milícia fundamentalista islâmica, até 2006, já controlava a capital somali, Mogadíscio, e a região de Jowhar.

Este ano, o Conselho de Segurança das Nações Unidas prorrogou, até março, a presença da Missão da União Africana para a Somália (AMISOM). Esta missão conta com cerca de 20.000 soldados no terreno que apoiam as autoridades na luta contra a insurgência dos grupos, no treino de militares e na chegada de ajuda humanitária aos civis.

De acordo com um relatório publicado pela “Food Security and Nutrition Analysis Unit – Somalia”, em 2021, cerca de 329.500 crianças vão sofrer de malnutrição severa na Somália. Este ano, o país sofreu com três estações de seca consecutivas e cerca de 25% da população precisa de assistência alimentar urgente. O site noticioso da ONU informou que já se contabilizam 2.9 milhões de somalis que foram obrigados a migrar para centros urbanos face à constante escassez de água potável. Este problema não apresenta soluções nos próximos meses face às projeções meteorológicas de pouca chuva.

A UNICEF está a pedir sete milhões de dólares (cerca de seis milhões de euros) antes do final de março para adquirir mais de 100 mil caixas de alimentos para distribuir pelos civis.

Guerra contra o Narcotráfico no México (2006-presente)

As guerras podem assumir diversas formas e não são necessariamente despoletadas por motivos políticos ou religiosos.

Com o enfraquecimento do narcotráfico colombiano nos anos 90, e com o assassinato de um dos maiores traficantes do mundo Pablo Escobar, vários outros cartéis de droga começaram a crescer principalmente no México, nos EUA e no Brasil.

Em 2006, os cartéis de droga ilegais mexicanos e o governo entraram em conflito. Foi com a subida do presidente Felipe Calderón que se iniciaram as maiores perseguições e capturas de indivíduos relacionados ao tráfico de droga. No entanto, segundo o Washington Post, a sua presidência (2006-2012) contou com cerca de 60.000 mortes de pessoas relacionados ao narcotráfico mexicano. Ruben Aguilar, comentador, político e antigo porta-voz do antecessor de Calderón, Vicente Fox, criticou o presidente em 2012 afirmando que, apesar dos seus discursos para acabar com a guerra do narcotráfico, havia “três vezes mais violência do que antes”.

Militar vigia a cidade de Fresnillo, em Zacatecas, onde foram assassinados 3 polícias municipais no dia 11 de janeiro de 2022. Créditos: STRINGER / REUTERS

A situação mexicana tem escalado desde 2014 quando a população procurou enfrentar diretamente os cartéis de droga, acusando o governo de ser cúmplice e corrupto. Em 2017, registaram-se mais de 25 mil vítimas, cerca de 70 assassinatos diários como consta no Diário de Notícias. O especialista em segurança, Alejandro Hope, explicou à emissora de televisão Univision que esta média pode ser, na realidade, muito maior uma vez que a estatística é feita com base no número de homicídios e não com base no número de vítimas.

De acordo com o El País do México, a taxa de homicídios reduziu cerca de 4% em 2021, mas a média diária elevou-se face a anos anteriores (cerca de 90 mortes por dia). Nesse ano, contabilizaram-se cerca de 30.000 vítimas mortais. No México, já morreram mais de 250 mil pessoas na guerra contra o tráfico de droga. Segundo o DN, “há indicadores que apontam para um aumento de homicídios durante a pandemia”.

 

Neste artigo, foram inumerados apenas quatro de centenas de conflitos ativos em todo o mundo. Apesar de alguns serem distantes da nossa realidade, é fulcral que eles sejam reconhecidos e que os civis recebam a ajuda necessária para sobreviverem.

Artigo de Sofia Guimarães

Revisto por Inês Santos

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