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RELIGIÃO: PRISÃO OU LIBERDADE?

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Abade do Mosteiro de Singeverga e professor na Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa, Bernardino Costa sentiu desde pequeno “a vontade de servir a Deus e aos outros”.

Com o apoio da família, Bernardino decidiu que a melhor maneira de concretizar a sua vocação seria “ao serviço da Igreja, como sacerdote diocesano”.

Entrou para o Seminário Maior do Porto e passado oito anos percebeu que o seu papel era junto da comunidade: “Percebi que Deus me chamava a uma vida ainda mais radical e, seduzido pelo silêncio e pela vida comunitária, entrei no Mosteiro de Singeverga.”.

Para Bernardino, a religião e a liberdade não são incompatíveis: “A religião não é contrária à liberdade, mas ensina-nos o verdadeiro sentido da mesma. Sempre me senti livre e nada me foi imposto”. Realça que é necessário ter uma noção clara dos dois conceitos: “Se partimos de uma falsa ideia de liberdade, nunca poderemos compreender o que é a religião. É preciso, portanto, uma ideia clara sobre a “religião” e uma ideia ainda mais clara sobre o que efectivamente significa “ser livre”. Se os conceitos estiverem claros, veremos que a liberdade não se opõe a religião. Quando falo de religião, refiro-me essencialmente ao cristianismo.”.

Aos olhos do abade o cristianismo não deve ser encarado como uma prisão: “Jesus Cristo era livre, como pessoa humana que era, mas essa liberdade conduziu-o ao mais alto valor da vida humana: dar a vida pelos outros. Seguindo o seu modelo, não podemos afirmar que a religião seja uma prisão. Se o cristianismo fosse uma prisão, já teria acabado e não tinha durado tanto tempo.”.

Isabel Teixeira e Mariana Fernandes estudam Ciências da Comunicação na Universidade do Porto, têm 19 anos e visões diferentes acerca da liberdade na religião.

Isabel é acólita na freguesia de Gatão, Amarante, e vê a religião como sinónimo de liberdade: “cada um é livre de escolher aquilo que quer, se [a religião] fosse uma prisão não diríamos a alguém que somos católicos.”

Por outro lado, Mariana acredita que “a religião é uma prisão que nos impediu de pensar mais longe e sonhar mais alto. A religião é contentamento e preguiça.”.

Homens e Mulheres: será que a liberdade religiosa difere entre os géneros?

Bernardino Costa diz não haver diferenças entre a liberdade do homem e a liberdade da mulher na Igreja, mas sim nas funções que cada um desempenha: “Há diferenças quanto aos ministérios, isto é, aos serviços que cada um desempenha dentro da estrutura da própria Igreja, mas em momento algum se despreza uma mulher pelo simples facto de ela ser mulher”.

No entanto, Mariana Fernandes tem uma opinião contrária e salienta que a religião é a origem dos principais preconceitos associados às questões de género “Os papéis associados a cada sexo que têm vindo a vigorar de há muito tempo para cá e têm as suas raízes na religião (…) A verdade é que determinados comportamentos levados a cabo pelos homens são vistos como pecados ou sacrilégios se evidenciados por uma mulher, por exemplo, a questão da pureza associada à virgindade.”.

Isabel Teixeira considera que as mulheres e os homens deviam ter os mesmos direitos dentro da Igreja podendo desempenhar os mesmos papéis “Talvez se se abrisse uma oportunidade, certamente, existiriam muitas mulheres com vontade de seguir esse caminho.”.

As crianças e a religião

Muitos são os casos de crianças obrigadas pela família a ir à catequese ou a assistir à eucaristia e muitas são as opiniões acerca desta imposição. Será que obrigar uma criança a frequentar estes rituais é limitar a sua liberdade?

Para Bernardino, estas obrigações são uma necessidade quando os pais querem dar uma educação cristã aos filhos e encara a catequese como uma forma de os pais honrarem o compromisso a que se propuseram: “Quando os pais apresentam os seus filhos para serem batizados, comprometem-se a dar educação cristã aos seus filhos. A Igreja fornece um itinerário catequético precisamente para ensinar o que significa ser cristão. Como podemos ser cristãos se não conhecemos os fundamentos do cristianismo? Como podemos ser cristãos se não conhecemos o “abc” da nossa religião? Foram os pais a pedir à Igreja para batizar os seus filhos, não foi a Igreja que exigiu que os batizassem. Aceitando o pedido, a Igreja perguntou se se comprometiam a dar ensino cristão aos seus filhos. Essa pergunta deve ser feita aos pais e não à Igreja. Como entender uma liberdade que não honra os seus compromissos?”.

Já Mariana considera “ridículo” uma criança ser obrigada a entrar numa religião que não escolheu: “Ainda hoje me ressinto por ter sido obrigada a assistir a um paleio que me dizia tanto como a estática da televisão”. Considera que a melhor opção é “deixar as pessoas crescerem e quando sentirem a necessidade de saber mais, apresentá-las a um leque de fés e possibilidades existentes e deixá-las perceber qual aquela com que mais se identificam. Obrigar pessoas seja a que tipo de crença for não faz sentido”.

A liberdade de crenças em Portugal

O Cristianismo é a religião com maior número de fiéis em Portugal e as suas tradições são, em grande parte, as tradições do país. No entanto, haverá espaço para outras religiões se expressarem?

Bernardino acredita que há espaço para todas as religiões e defende que todas devem receber a mesma atenção e ter direito ao mesmo espaço público: “Normalmente acusamos a Igreja Católica de ser dominante porque implica grande parte da sociedade portuguesa, mas na atualidade, bem vistas as coisas, as outras religiões têm mais “tempo de antena” do que a Igreja Católica. Os cristãos são perseguidos verbalmente e ninguém fala disso. No entanto, se alguém diz alguma coisa contras as outras religiões ou seitas, todos dão valor ao assunto. Eu acho que há espaço para se expressarem todas as religiões, mas defendo que devia ser um debate equilibrado e equitativo.”.

Mariana acredita na liberdade religiosa, mas considera que ainda há preconceitos e estereótipos associados a diferentes religiões: “A verdade é que cada um é livre de escolher e praticar a religião que lhe aprouver. No entanto, a questão é a mesma para o racismo e a homofobia. Vai haver sempre indivíduos ignorantes que pensam que podem opinar acerca da vida dos outros ou, infelizmente, fazer das palavras amargas ação. Este é um mal difícil de erradicar.”.

Isabel considera que “as pessoas têm muitos preconceitos com aquilo que não conhecem” e que todas as religiões teriam espaço para se manifestarem “se todos soubéssemos respeitar a escolha de cada um”.

A liberdade religiosa é um conceito que está protegido pela Constituição da República Portuguesa e pelo artigo 18º da Declaração Universal dos Direitos do Homem “Toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito implica a liberdade de mudar de religião ou de convicção, assim como a liberdade de manifestar a religião ou convicção, sozinho ou em comum, tanto em público como em privado, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pelos ritos.”.

Mariana encara a liberdade como um pressuposto que deve unir as religiões: “É um direito nosso e pelo qual devemos lutar. Fanatismos religiosos à parte.”.

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